Título: Museus agora valorizam educação e atraem mais público
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/02/2006, Vida&, p. A12

Há capacitação de professores, atividades para crianças e produção de material didático

Volta às aulas, volta aos museus. A recente valorização do caráter educativo dos museus brasileiros tem feito crescer o público durante o calendário escolar, que começa neste mês. As crianças atualmente são recebidas com atividades interativas para que aprendam e se interessem pelas exposições históricas, científicas ou artísticas. Seus professores são capacitados previamente pelas equipes de educadores, profissionais agora quase obrigatórios nos museus.

Muitos locais também organizam materiais didáticos para serem usados nas salas de aula sobre conteúdos que podem ser vistos durante a visita. "Não se concebe mais um museu sem esse tipo de compromisso. Eles não podem mais ser meros guardadores de relíquias", diz Jurema Machado, coordenadora do setor de cultura da Unesco, braço da Organização das Nações Unidas (ONU). Para ela, a educação "dessacraliza" os museus que, no passado, não admitiam aulas ou qualquer tipo de interação com a exposição.

Um dos exemplos dessa mudança é o Museu Paulista, mais conhecido como Museu do Ipiranga. Seu setor educativo existe há apenas quatro anos e, no fim de 2005, ampliou, pela primeira vez, o número de educadores. A iniciativa faz parte de um processo de reformulação que começou em 2003, quando pesquisas haviam indicado que os visitantes pouco entendiam do que era exposto. Desde então, reformas - que ainda não acabaram - têm agregado interatividade e mais informação às obras e objetos do acervo e panfletos ilustrados e explicativos foram elaborados.

Atualmente, a equipe educativa produz fichas temáticas para os professores usarem durante a visita e kits com jogo da memória, quebra-cabeça e outros brinquedos para utilização em sala de aula. "A idéia é dar mobilidade para o professor vincular os conteúdos do museu ao seu projeto pedagógico", diz a educadora Denise Peixoto. Metade dos cerca de 400 mil visitantes que o Museu do Ipiranga recebe por ano são estudantes.

Denise lembra que o papel dos museus se encaixa justamente no que as modernas leis educacionais chamam de transversalidade de conteúdos, defendida por qualquer educador. "Na sala de aula, o aluno abre o livro de matemática, fecha, depois abre o de biologia. Aqui, ele pode entender de verdade como as disciplinas se interagem", diz o diretor da Estação Ciência, Wilson Teixeira.

O local, mantido pela Universidade de São Paulo (USP), é um dos pioneiros na interatividade de atrações como viagem pelo corpo humano, planetário inflável e um recém inaugurado ouvido gigante. Seu público tem crescido a cada ano - passou de 240 mil em 2004 para 400 mil em 2005 - a maioria deles durante o período escolar. Lá, há provas de que o investimento em educação dá retorno. "Temos pesquisas mostrando que a criança vem com a escola e, 15 dias depois, volta com a família", afirma Teixeira.

MAIS QUE UM COMPLEMENTO

O Instituto Butantã - com a já tradicional exposição de cobras, aranhas, escorpiões, entre outros - também tem investido mais em educação. Em março, inaugura a Casa do Horto, uma casinha no meio do mato onde as crianças e jovens poderão manusear animais e participar de jogos. O intuito é chamar a atenção para a conservação de animais em extinção. "O museu não é só um complemento à escola. Ele pode trabalhar seus próprios conteúdos pedagógicos, com é o caso da preservação", diz a pesquisadora do Butantã Alessandra Fernandes Bezerra, que faz doutorado na USP sobre educação em museus.

A Unesco hoje incentiva projetos educativos em museus no mundo todo e tem a ajuda do International Council of Museums (Icom), uma espécie de ONG formada e mantida pela entidade. "O museu tem estímulos visuais, desloca o aluno da escola e desperta a curiosidade", diz Jurema. O Ministério da Cultura também tem feito um trabalho de conscientização sobre o papel educativo dos museus. No Brasil, essa valorização - comum principalmente na Europa - só se intensificou nos anos 90.

"A arte estimula a reflexão e a interpretação", afirma a educadora Luciana Pasqualucci, do Museu de Arte Moderna (MAM). Seu setor educativo existe desde 1998 e hoje - apesar de lidar com a arte contemporânea, menos familiar a grande parte das crianças - já tem entre seu público um terço de estudantes. A maior atração para elas ainda é a escultura de uma aranha gigante que pode ser vista até pelo lado de fora. Mas as crianças também são estimuladas a pintar e a fotografar, usando as exposições como gancho. "Elas passam de expectadoras a participadoras."

O Museu de Arte de São Paulo (Masp) também oferece oficinas para crianças aos sábados, com material ilustrativo. E dá aulas gratuitas a professores sobre as futuras exposições. A próxima, no dia 11, será sobre o pintor impressionista Edgar Degas. O objetivo é prepará-los para conduzirem seus alunos e aproveitarem o conhecimento vindo das obras do artista francês, em exposição no Masp a partir de abril.

No dia 18, o Museu Lasar Segall reinicia as atividades para crianças e seus pais ou responsáveis sobre a vida e obra do artista que dá nome ao local, usando jogos de memória, dados e brincadeiras. Em 2005, o projeto, que é gratuito e ocorre sempre no terceiro sábado do mês, teve lotação esgotada. O museu tem parceria com secretarias de educação e também dá cursos para professores.