Título: Sem-teto param a Prestes Maia
Autor: Natália Zonta
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/02/2006, Metrópole, p. C8

Entre os dias 15 e 21, 1.630 pessoas (468 famílias) serão retiradas de um prédio de 23 andares ocupado na Avenida Prestes Maia, na Luz. Para tentar impedir a reintegração de posse, pelo menos 300 moradores, integrantes do Movimento dos Sem-Teto do Centro (MSTC), bloquearam os dois sentidos da via, ontem, das 6h10 às 7h36. Com o bloqueio, houve 3 quilômetros de congestionamento na direção da zona sul e 2 quilômetros no sentido oposto, segundo a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).

A Tropa de Choque da PM foi acionada para retirar os manifestantes. Não houve confronto. O tráfego foi liberado e os sem-teto voltaram para o prédio cheios de incertezas. ¿Queremos continuar aqui. A maioria trabalha na região¿, disse uma líder do movimento, Jomarina Pires da Fonseca, de 48 anos.

O prédio, ocupado desde 2003, está deteriorado, com elevadores quebrados e escadas cheias de rachaduras. Infiltrações são aparentes e a fiação elétrica clandestina fica exposta. No térreo, há uma biblioteca com 3 mil títulos, montada pelos próprios moradores. Cerca de 400 pessoas já ocuparam a torre vizinha, que é parte do imóvel e pegou fogo em 2003.

De ocupação, o local passou a ser endereço fixo. Na bancada da recepção improvisada, havia correspondência para os ocupantes, como faturas de cartão de crédito e carnês de lojas. Os apartamentos, antes amplas salas, foram divididos por tapumes e ganharam vários cômodos.

A vida dos moradores está adaptada ao centro. ¿Todas as crianças estudam na região¿, disse Jomarina. Embora nunca tenha dado uso aos prédios, o proprietário, Eduardo Amorim, pede a integração do imóvel, adquirido por seu pai em 1989. Segundo ele, a dívida do IPTU, atrasado há 10 anos, está sendo negociada.

¿Decidi brigar pelo direito de reaver o imóvel porque agora existem dois interessados em comprá-lo¿, diz. Em casos de reintegração como esse, o proprietário tem de arcar com os custos de transporte e armazenamento dos bens dos ocupantes. O serviço foi estimado em R$ 40 mil pelo proprietário. A Secretaria Municipal de Habitação quer transferir parte dos moradores para os prédios do Programa de Arrendamento Residencial, mas eles recusaram a proposta porque os endereços não são no centro.

Para as famílias com renda inferior a três salários mínimos, foram oferecidas vagas em albergues. Mas, sem o acordo dos moradores, a secretaria afirmou que os sem-teto da Prestes Maia não terão prioridade nas listas de programas habitacionais e, portanto, podem ir até mesmo para a rua. A desapropriação não deverá ser fácil ¿Vamos acampar na região depois que sairmos¿, disse Jomarina.

Ontem à tarde, o secretário Municipal da Habitação, Orlando Almeida, fez uma visita à promotora da Habitação e Urbanismo, Amabel Tucunduva, que cuida do caso da ocupação da Prestes Maia. Procurados pela reportagem, nenhum dos dois quis comentar a o assunto.