Título: À espera de mais bondades
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Fonte: O Estado de São Paulo, 20/02/2006, Notas e Informaçoes, p. A3

Indianos e chineses conquistam mercados em todo o mundo, tomando espaço dos concorrentes, enquanto os empresários brasileiros continuam condenados a arrastar o peso de impostos excessivos, juros muito altos e câmbio cada vez mais desfavorável. Não se pode mudar o câmbio de uma hora para outra, argumenta o governo, mas isso não o isenta de tomar outras medidas para tornar a produção nacional mais competitiva. Redução de impostos seria a providência de efeito mais rápido, e esse foi um dos assuntos da última reunião do Conselho Nacional do Desenvolvimento Industrial (CNDI).

Depois do encontro, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, disse esperar novas medidas de alívio tributário ainda neste semestre. Destacou três mudanças defendidas há tempos pelos industriais: 1) ampliação do prazo de recolhimento de impostos, para ajustá-los aos prazos de recebimento das vendas. Não tem sentido, argumentou, dar ao cliente crédito por 60 dias e ter de pagar o tributo em 30; 2) diminuição do tempo, hoje de 24 meses, de compensação dos créditos de PIS e Cofins; 3) redução da cunha tributária nas operações financeiras destinadas a investimento produtivo.

Nenhuma dessas medidas seria um favor especial ao setor produtivo. Nenhuma seria caracterizável como subsídio condenado pelas normas internacionais de comércio. Com alterações como essas, o governo apenas daria à indústria brasileira condições tributárias menos desvantajosas para competir no mercado global. Não se criariam benefícios fiscais injustos para este ou aquele grupo de empresários ou de compadres protegidos pelo governo.

Segundo o presidente da Confederação Nacional da Indústria, foi apresentada, na reunião, uma comparação entre os custos de investimento no Brasil e na China. Investir no Brasil, segundo Armando Monteiro Neto, custa entre 15% e 20% mais. Mesmo sem esse fator, pode-se acrescentar, seria difícil competir com a economia chinesa na atração de capitais - e, mesmo assim, o País continua a receber um volume razoável de investimento direto estrangeiro. Poderia receber muito mais, com certeza, se o sistema tributário fosse menos irracional e mais favorável à expansão dos negócios.

A China investe anualmente cerca de 40% do Produto Interno Bruto (PIB). No Brasil, o investimento mal tem chegado à metade disso. O governo pouco investe porque há pouco espaço no orçamento para obras de infra-estrutura e outras despesas destinadas a fortalecer a capacidade produtiva. O setor privado continua a investir, teimosamente, para não ser jogado fora de todos os mercados, mas enfrenta condições muito desfavoráveis, a começar pelo excessivo custo do capital. Grande parte desse custo corresponde a pesados impostos e contribuições federais e estaduais.

Pequenas melhoras têm ocorrido principalmente por iniciativa do governo federal, porque os governos estaduais, quando não estão envolvidos na guerra fiscal, raramente concedem redução de tributos. Sua resistência tem dificultado uma efetiva reforma tributária.

Mas os cortes de impostos federais têm sido mínimos, em comparação com a montanha de tributos suportada pelo sistema produtivo. A indústria, naturalmente, festeja qualquer desoneração, e recebeu com aplausos, no ano passado, a chamada MP do Bem.

Sem uma política ampla e bem definida de alívio fiscal, os empresários só podem torcer pela redução de impostos em ritmo de conta-gotas. A expectativa, agora, é de uma nova medida provisória com mais algumas medidas de redução tributária. Mas isso ainda vai depender, como ressalvou o presidente da Confederação Nacional da Indústria, da elaboração de uma proposta para encaminhamento ao Ministério da Fazenda.

A expressão "política industrial", no Brasil, é uma evidente figura de retórica. Não merece o nome de política uma coleção de ações descontínuas e negociadas uma a uma, como têm sido as medidas de alívio tributário. Sem metas fiscais mais ambiciosas, o governo é incapaz de controlar a espiral dos gastos crescentes e não pode, portanto, conter a voracidade tributária. Nessas condições, qualquer mudança de impostos a favor da produção será resultado de dura batalha travada contra o Fisco.