Título: Tapa-buraco não resolve situação das estradas
Autor: Rodrigo Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/02/2006, Nacional, p. A10

Além dos problemas causados pela chuva, que dificulta os reparos, muitas obras foram mal executadas

Pouco mais de um mês após o início da operação tapa-buracos do governo federal, lançado em tom de campanha pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva - investimento de R$ 440 milhões -, algumas das principais rodovias do País continuam apresentando péssimas condições de trafegabilidade.

Além do período de chuvas, que dificulta e torna menos eficientes os trabalhos de reparos, muitas das obras foram mal executadas, algumas empreiteiras utilizaram materiais impróprios e outras não estão cumprindo o cronograma. Até obras sem contrato já foram identificadas - o que é ilegal, apesar de a operação ser classificada como emergencial e dispensar licitação.

Na terça-feira o Estado publicou reportagem com foto do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Augusto Nardes segurando uma placa de asfalto desprendida na BR-070, rodovia incluída no plano de emergência do Mato Grosso. O ministro percorreu 1.045 quilômetros de rodovias no Estado e constatou falta de contratos assinados e má execução de obras. "Não é possível que as estradas continuem como estão", disse, impressionado com o volume de tráfego de carretas escoando o início da safra em rodovias tão precárias. A operação no Mato Grosso prevê a recuperação de 1.289 quilômetros de cinco rodovias federais, a um custo de R$ 22,4 milhões.

Na Fernão Dias, que liga a capital paulista a Minas Gerais, uma equipe da Delta Construções S.A. refazia na quinta-feira os remendos no km 84, sentido São Paulo. O trecho, que fica em São Paulo, passou por reparos em 9 de janeiro, primeiro dia da operação. "Aqui o tráfego pesado é grande, não agüenta", disse um dos operários.

Pouco adiante, outra equipe ocupava duas das três pistas do km 87 para cobrir um enorme buraco em estado crítico desde terça-feira. "Não sabemos se foi infiltração ou uma galeria rompida", esquivou-se um técnico da empreiteira. Ele confirmou, entretanto, que há cerca de um mês haviam sido feito reparos nos dois trechos.

Ao longo dos 120 quilômetros percorridos pelo Estado na Fernão, novos buracos, remendos desfeitos e sinalização deteriorada eram vistos com freqüência. "É uma rodovia de tráfego muito pesado, exige manutenção, não dá para ficar retalhando", analisa a chefe do Departamento de Transportes e coordenadora do Laboratório de Pavimentação da USP, Liedi Bernucci, afirmando que isso deve se repetir em outras rodovias.

No percurso, não foram encontradas mais equipes da Delta, nem técnicos do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT), órgão responsável pela fiscalização, acompanhando as operações - irregularidade apontada em outras rodovias nas auditorias preliminares do TCU.

O contrato da Fernão prevê a recuperação, em 90 dias, de 90,4 quilômetros de cada sentido das pistas, por R$ 360 mil. O DNIT informou que o engenheiro responsável pela fiscalização circulava pela rodovia na quinta-feira e outras duas equipes trabalhavam no km zero da Fernão, sentido Minas.

Em Minas Gerais, Estado com maior número de intervenções, o TCU constatou que 80% não tinham contratos assinados. "Na administração pública não existe contrato verbal", observou o diretor-técnico do TCU mineiro, José Reinaldo da Motta, que vê na irregularidade indícios de serviço feito "à toque de caixa". Um auditor do TCU local informou que há trechos em situação considerada "calamitosa", como na BR-120 (em Ponte Nova), BR-491 (Alfenas), BR-265 (Nepomuceno) e BR-369 (Campos Gerais).

Na Bahia o TCU já notificou seis empreiteiras por atrasos no cronograma das obras que podem ser multadas. Na BR-324 (Salvador-Feira de Santana), técnicos do TCU identificaram uso de cascalho no lugar de massa asfáltica, método irregular repetido na BR-242, entre Seabra e Ibotirama.