Título: Isenção acelera queda da Selic
Autor: ADRIANA FERNANDES, FABIO GRANER E GUSTAVO FREIRE
Fonte: O Estado de São Paulo, 19/02/2006, Economia & Negócios, p. B7

Com impacto nas taxas de juros de longo prazo e no dólar, Copom terá de agir mais rápido

A decisão do governo de isentar os investimentos estrangeiros em títulos públicos pôs o Banco Central numa encruzilhada e deve forçar a aceleração do processo de queda da Selic. Na avaliação de fontes do governo e do BC, com o impacto da medida nas taxas de juros de longo prazo e na taxa de câmbio, o Copom terá que reduzir a Selic mais rapidamente para evitar desequilíbrios na economia. Entre economistas, a expectativa também é a mesma. Já há analistas que apostam numa queda de até dois pontos porcentuais na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), no início de março.

"O BC vai ter de correr e reduzir o juro mais rápido", disse uma fonte do banco. Com o aumento da demanda dos investidores pelos papéis públicos, o Tesouro poderá impor taxas de longo prazo mais baixas. Nesse cenário, fica difícil para o BC sustentar a Selic em níveis altos, sob pena de desestimular o financiamento de longo prazo do Tesouro. Outro ponto que foi apontado quinta-feira pelo próprio secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, é o fato de que a queda no juro de longo prazo indica que o mercado está apostando que a inflação cairá ainda mais no futuro. Portanto, estaria aberto o espaço para um corte mais intenso na Selic.

Para o consultor Amir Khair, a tendência é que o juro básico seja forçado para baixo pelo próprio mercado. "O BC não terá como ficar arbitrando uma Selic elevada." Ele avalia que o Tesouro pôs o BC no córner. Segundo Khair, a Selic está artificialmente elevada pelo Copom. O economista, que é ligado ao PT, pondera que a redução da taxa pode ser feita sem preocupação com a inflação. "O BC está numa posição confortável para reduzir os juros com os índices de inflação dentro da meta, talvez até abaixo."

O professor de economia da Unicamp, Francisco Lopreato, ressaltou que a inflação sob controle já permitia uma queda maior na Selic e a isenção dos investimentos estrangeiros é mais uma sinalização de que os juros têm que baixar mais rapidamente. "As condições já estavam dadas. Essa medida só reforça essa tendência. O BC está sendo mais realista do que o rei."

Apesar de concordar que a isenção vai pôr o BC contra a parede, o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, acha que os integrantes do Copom não vão ceder. "O BC tem de arbitrar a Selic tendo em vista as metas de inflação e não levando em conta fatores extras como a desoneração."

Já para o professor da PUC de São Paulo Antônio Corrêa de Lacerda, o descasamento entre a Selic e as taxas de mercado torna cada vez mais difícil para o BC justificar um juro tão alto. Elogiando o incentivo ao capital estrangeiro, por conta do impacto nos juros de longo prazo, ele alertou que a preocupação agora tem de ser com a valorização do dólar. "Isso pode provocar distorções na economia e na produção nacional, levando a uma desindustrialização."

Para combater a valorização do real, Lacerda defendeu, além da queda mais forte na Selic, um aumento nas compras de dólares e títulos da dívida externa. O Tesouro e o BC já anunciaram um programa de recompra antecipada de bônus com prazo de vencimento até 2010 e de bradies (papéis oriundos da renegociação da dívida externa). O programa prevê uma recompra de cerca de US$ 20 bilhões até dezembro, mas Levy já disse que o volume pode crescer.

O efeito colateral da desoneração no câmbio também preocupa o governo. Por isso, crescem as pressões para que as alíquotas do Imposto de Importação sejam reduzidas, pelo menos, para os setores com menor grau de competição. Com isso, aumentariam as importações e, conseqüentemente, a saída de dólares, o que amenizaria o desequilíbrio no fluxo que tem derrubado a moeda. Mas há resistência de setores industriais.