Título: Tesouro Nacional é agora credor em US$ 300 milhões
Autor: Adriana Fernandes ,Renata Veríssimo
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2006, Economia & Negócios, p. B3

Chega ao fim período em que dívida externa era traço mais marcante do País

O governo do Brasil virou credor em dólares, de US$ 300 milhões, em uma ruptura com o longo período da história nacional no qual a dívida externa foi um dos traços mais marcantes, constantes e problemáticos do País.

O Tesouro brasileiro tem um endividamento externo bruto, mas tem também reservas internacionais. No mercado doméstico, ele tem dívidas atreladas ao câmbio, mas também tem créditos cambiais.

Computando esses quatro componentes, o governo hoje ostenta um crédito de US$ 300 milhões, segundo estimativa do J.P. Morgan, banco de investimentos americano. Essa conta exclui a posição financeira das estatais, como Petrobrás, Banco do Brasil, etc.

Drausio Giacomelli, vice-presidente de mercados emergentes do J.P. Morgan, baseado em Nova York, explica que com base na entrevista coletiva do secretário do Tesouro, Joaquim Levy ¿ para anunciar o plano de recompra da dívida externa ¿, o banco concluiu que o governo brasileiro já era um credor líquido em dólares. Na entrevista, Levy anunciou um plano de recompra de títulos da dívida externa bruta, com potencial de US$ 20 bilhões.

Durante a coletiva, o secretário do Tesouro revelou que aquele programa já tinha se iniciado, e que já haviam sido recomprados US$ 2,3 bilhões em títulos da dívida externa. Este valor é US$ 700 milhões superior à estimativa que o J.P. Morgan tinha das recompras até agora (o banco já presumia que o governo estava recomprando). Antes de ter aquele número oficial, o J.P. Morgan estimava que o governo brasileiro ainda era devedor líquido de US$ 400 milhões. Mas, considerando que a dívida bruta é US$ 700 milhões menor do que a sua projeção anterior, o banco chegou à conclusão de que, na verdade, o Tesouro já é credor de US$ 300 milhões.

A conta do J.P. Morgan inclui dívidas e créditos do Tesouro no mercado interno, em títulos e swaps cambiais (instrumentos equivalentes a títulos). Nesse segmento, o governo já tem créditos dolarizados de US$ 3,1 bilhões. O Tesouro tem ainda mais US$ 8,7 bilhões em outros tipos de créditos no mercado interno. Por outro lado, a dívida externa líquida do Tesouro ¿ isto é, dívida externa menos reservas internacionais ¿ é de US$ 13,6 bilhões. O resultado líquido ainda é uma dívida de US$ 1,8 bilhão.

Incluindo, porém, compras do Tesouro no mercado cambial a serem liquidadas nos próximos 6 meses, de US$ 2 bilhões, a posição líquida do governo transforma-se em um crédito de US$ 300 milhões (a diferença deve-se ao arredondamento).

Para Giacomelli, o anúncio do governo de recomprar US$ 20 bilhões em títulos da dívida externa até 2020 já era esperado pelo mercado por ser uma alternativa com vantagens óbvias. Ele observa que, quando compra dólares para compor as reservas internacionais, o governo lança títulos no mercado interno para recolher os reais jogados em circulação.

Como as aplicações internacionais em dólares e outras moedas rendem cerca de 5% ao ano, e o custo dos títulos internos é de 17%, o País paga um preço alto para aumentar suas reservas. ¿A valorização do real torna essa conta ainda mais cara.

Ao quitar a dívida externa com as reservas, porém, o governo faz uma economia, já que a rentabilidade delas é menor do que a dos títulos externos brasileiros