Título: PT aproveitará festa de aniversário para lançar candidatura de Lula
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2006, Nacional, p. A12

Com jantar a preços entre R$ 200 e R$ 5.000, partido quer espantar a crise e criar movimento 'queremista'

Sob impacto da maior crise de sua história e com a antiga cúpula dizimada pelo escândalo do mensalão, o PT completa hoje 26 anos sem fazer o acerto interno de contas, mas empenhado em dar "a volta por cima" para reeleger o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira manifestação coletiva com esse objetivo vai ocorrer na segunda-feira, quando o PT lançará informalmente a candidatura de Lula à reeleição, numa festa cuidadosamente preparada para celebrar o aniversário do partido e espantar a crise.

Tudo foi planejado nos mínimos detalhes: Lula será aclamado por cerca de mil petistas no jantar previsto para dia 13 - número do PT - na Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB), em Brasília. Será uma catarse paga, com ingressos que vão de R$ 200 a R$ 5 mil. Diante de apetitosos camarões aromáticos com côco e açafrão e medalhões de filé ao molho de mostarda e damascos, os companheiros de Lula - incluindo ministros e até empresários simpáticos ao partido - iniciarão ali uma espécie de movimento "queremista", como o que se alastrou pelo País em 1945 para defender a permanência de Getúlio Vargas no poder.

O coro promete entoar o indefectível refrão "1,2,3, Lula outra vez". "É o momento de reencontro do presidente Lula com o PT, após a crise", resume o tesoureiro do PT, Paulo Ferreira, sucessor de Delúbio Soares - único expulso pelo partido depois de escancarado o caixa 2 petista. "Passado o histerismo denuncista, que quis transformar o PT no único patinho feio da história, vamos dizer ao presidente que a reeleição dele é fundamental para o Brasil."

Lula continua repetindo que não tem pressa para decidir, mas este é apenas o discurso oficial: candidatíssimo, ele está muito animado com sua recuperação, indicada nas pesquisas, e sonda nomes para montar o comando da campanha. É nesse clima que o PT promoverá a pajelança de segunda-feira.

Sem o deputado José Dirceu - ex-chefe da Casa Civil que foi cassado em novembro pela Câmara - e sem José Genoino, obrigado a renunciar à presidência do PT em meio à crise -, Lula já conversou com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, sobre a possibilidade de ele coordenar a campanha da reeleição, como revelou o Estado.

Não bateu o martelo porque ainda avalia a conveniência dessa operação, já que Palocci teria de deixar a Fazenda. Além disso, o Planalto tem feito consultas para verificar se, nesse caso, as denúncias contra o ministro não seriam "exportadas" para o comitê de Lula.

Na prática, o desenlace da crise no PT está intimamente ligado à conquista de um segundo mandato para o presidente. "Temos uma tarefa fundamental agora para recuperar o PT e garantir o resgate da imagem do partido: reeleger Lula", afirma Paulo Frateschi, que comanda o partido em São Paulo.

"Seria infantilidade fazer uma caça às bruxas e gastar energia com um processo interno por causa de caixa 2, um problema que não é de hoje nem começou com o PT", concorda o deputado Ricardo Berzoini (SP), presidente do partido. "Se o Conselho de Ética e as CPIs não conseguiram apurar, não seremos nós que demonizaremos cinco deputados flagrados fazendo algo que, como disse Jutahy Júnior (PSDB-BA), não deve ser motivo para cassação", completa, numa referência aos parlamentares do PT que enfrentam o corredor da morte.

'EDIFÍCIO POLÍTICO'

Para Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais do PT, 2006 é o ano de impedir o PSDB de voltar ao Planalto, e não de promover ajuste de contas. Da Articulação de Esquerda, Pomar observa, porém, que o partido precisa fazer a crítica teórica e prática do "edifício político" montado por José Dirceu, se quiser sobreviver.

"A crise desse modelo de partido vem de 1995, quando Dirceu assumiu a presidência do PT e adotou uma linha política de abandono do socialismo, rebaixamento ideológico e pragmatismo nas alianças como atalho para chegar ao poder", argumenta Pomar.

É nos capítulos das alianças e da política econômica dirigida por Palocci que estão as maiores divergências na seara petista. "Se depender de mim, não faremos coligação com o PTB, que não passa de um balcão de negócios", diz o secretário-geral do PT, Raul Pont, da Democracia Socialista, sem esconder o ódio da sigla que abriga o ex-deputado Roberto Jefferson, autor da denúncia do mensalão.

Se depender de Lula, no entanto, quanto mais alianças forem fechadas, melhor. Três anos de governo e um Jefferson no meio do caminho não abalaram a convicção do presidente, que está disposto a enquadrar o PT. Mesmo que, para isso, o partido tenha de sangrar.

COLABOROU MARIANA CAETANO