Título: Pena alternativa engatinha no País
Autor: Laura Diniz
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2006, Metrópole, p. C1

A certidão de nascimento já tem 21 anos, mas o sistema de penas alternativas ainda engatinha. Além de poder ser uma punição mais de acordo com o crime, a fiscalização de quem cumpre pena alternativa custa cerca de R$ 60,00 por mês, enquanto um preso custa quase R$ 800,00. O índice de reincidência do preso varia de 70% a 80% e, no caso da pena alternativa, cai para 12%. Mas ainda se prefere mandar à cadeia, com assassinos e estupradores, quem furtou um frasco de xampu.

No Estado de São Paulo, projeções otimistas apontam para 50 mil penas e medidas alternativas aplicadas. Para efeito de comparação, no Juizado Especial Criminal da Barra Funda, que concentra metade das ações por crimes de menor potencial ofensivo na capital, há 28.177 processos em andamento. Todos os crimes apreciados têm penas de até um ano, que podem ser transformadas em alternativas.

O Brasil tem 39 Centrais de Penas Alternativas (CPA) - que ajudam o juiz a adaptar a sanção ao perfil do condenado e fiscalizar seu cumprimento. Em 1990, havia em São Paulo 14 presídios - e delegacias abarrotadas de presos. Em 2005, o número de presídios saltou para 130. No Estado, o déficit de vagas chega a 30 mil.

"O Brasil tem uma ideologia repressiva. Impera a visão de que a única resposta para o crime é a cadeia", diz o criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. "As penas alternativas são mais um exemplo de políticas públicas apropriadas que não são usadas", afirma a professora de Direito da Fundação Getúlio Vargas, Maíra Machado.

ESTRUTURA

Em 2004, havia sete centrais no Estado. "O plano é chegar até o fim de 2006 com 32", revela Mauro Rogério Bitencourt, diretor do departamento de Reintegração Social da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP). Na capital, só há uma CPA. Em parceria com a Prefeitura, a SAP planeja montar uma central só para mulheres e outras cinco até o fim do ano.

"O Ministério da Justiça recomenda à Justiça que monte Varas de Execução especializadas em penas alternativas", conta o diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Maurício Kuehne. Há 8 varas de penas alternativas no País. Segundo ele, o Judiciário está hoje menos relutante em aplicar sanções alternativas.

Kuehne acha que os órgãos penitenciários devem continuar construindo presídios, em vez de aparelhar o sistema alternativo. "Não dá para ficar com 4 mil presos numa prisão com capacidade para 1,5 mil", diz, apesar de acreditar na eficácia do outro tipo de pena. "Mas estamos numa camisa de força."

O promotor Roberto Livianu faz um mea culpa em nome do Ministério Público e da magistratura. "Juízes e promotores se preocupam pouco com o que vem depois da condenação. A execução da pena é segundo plano." Mariz concorda: "A maioria dos juízes apenas aplica a lei, não tem uma visão social mais ampla."