Título: MST anuncia '2006 vermelho' e faz 14 invasões em Pernambuco
Autor: Angela Lacerda e José Maria Tomazela
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2006, Nacional, p. A4

Com a ocupação de 15 áreas em Pernambuco neste final de semana, o MST deu início ao que o movimento batizou de "2006 vermelho": em pleno ano eleitoral, invasões mais cedo, em maior número e acompanhadas de outras formas de ação, como a greve de fome. Tudo para aumentar a pressão para que o governo Lula cumpra suas metas de assentamento e, também, para tentar influenciar o debate eleitoral.

"Não haverá trégua", afirmou o líder Jaime Amorim, ontem de madrugada, em São Lourenço da Mata, região metropolitana do Recife, onde mais de 300 famílias reocuparam o engenho São João, pertencente ao Grupo Votorantim. "Não vamos ficar reféns das eleições e da Copa do Mundo. Este é um ano importante para a reforma agrária e vamos nos mobilizar."

"O MST está animado pela ascensão ao poder de alternativas políticas que surgiram no calor da luta popular", disse o dirigente nacional João Paulo Rodrigues, citando como exemplo a eleição de Evo Morales, na Bolívia, que se juntou a governantes considerados populares e eleitos há mais tempo, como Néstor Kirchner, na Argentina, e Hugo Chávez, na Venezuela.

O "2006 vermelho" representa uma estratégia nova para o movimento dos sem-terra. Em 2002, ano da eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, o MST tinha adotado outra posição: reduziu ao mínimo suas ações para não criar problemas ao PT. Agora, só em Pernambuco a meta é chegar a 30 invasões até o próximo mês.

Nesse Estado, em que o MST é especialmente ativo, as invasões começaram mais cedo este ano - em geral, elas aconteciam em abril. Sob o comando de Jaime Amorim, as liderenças regionais do movimento planejam fazer greve de fome a fim de obter a desapropriação de áreas de conflito e o cumprimento da meta do Incra para 2006, de cerca de 8 mil famílias.

Novas ações devem ocorrer para marcar os 10 anos do massacre de Eldorado de Carajás. "A polícia do Pará matou 19 trabalhadores sem terra no dia 17 de abril de 1996 e até hoje ninguém foi punido", constata Amorim. Na ocasião, 14 líderes fizeram greve de fome por 11 dias, e o movimento recebeu a Fazenda Normandia, em Caruaru, onde hoje funciona a sede do MST no Estado. Agora, a greve de fome será repetida se, até 17 de abril, não forem desapropriados o Engenho Bonito, no município de Condado, pertencente ao Grupo João Santos, e o Engenho São Gregório, pertencente à Usina Estreliana, do empresário Gustavo Maranhão. As duas áreas já eram requisitadas pelo movimento em 1996.

Jaime Amorim disse que a antecipação das ações também está relacionada à conferência sobre reforma agrária, que começa hoje em Porto Alegre, organizada pela FAO, o braço da Nações Unidas na área de agricultura e alimentação. "A conferência mostra que mesmo com a globalização, a reforma agrária é uma questão emergencial na América do Sul", disse.

INTERESSE POLÍTICO

No Pontal do Paranapanema, interior de São Paulo, os líderes regionais também anunciaram que vão intensificar suas ações. De acordo com João Paulo Rodrigues, a idéia é não restringir a agenda às reformas no campo. Os militantes serão mobilizados também para exigir mudanças na economia. "O programa de todo candidato terá de mostrar claramente como será sua política e se a reforma agrária será prioridade", explicou.

Em São Paulo, o MST liderou 16 invasões neste ano, 15 delas no Pontal do Paranapanema. O número corresponde a metade das ações de todo o ano passado, quando houve 30 invasões naquela região.

Rodrigues disse que o movimento tem o compromisso de discutir problemas mais gerais do brasileiro. Por isso, neste mês e no próximo, haverá manifestações pelo Dia Internacional da Mulher, contra a presença brasileira no Haiti e jornada em defesa das águas, por exemplo.