Título: Irã ameaça acelerar programa nuclear
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2006, Internacional, p. A11

O governo iraniano ameaçou ontem retomar o processo de enriquecimento de urânio em larga escala se a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) encaminhar o Irã ao Conselho de Segurança (CS) - instância máxima da ONU, com poder de impor sanções econômicas e militares. O conselho diretor da AIEA, denominado junta de governadores e integrado por 35 países, se reúne hoje em Viena. Vai avaliar o programa nuclear iraniano, com base num relatório que será apresentado pelo diretor da agência, o egípcio Mohamed el-Baradei.

O motivo da crise são as suspeitas de que o Irã tenha como objetivo a produção de armas atômicas, o que constituiria uma violação do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP). A expectativa é que a AIEA confirme a decisão de sua reunião de emergência, no dia 4 de fevereiro, que aprovou uma resolução recomendando o envio do caso ao CS.

Isso parece claro porque na semana passada vazaram para a imprensa trechos do relatório de Baradei, no qual são relacionados aspectos suspeitos do programa iraniano. Além disso, nesse intervalo de um mês, negociações do Irã com a Rússia e países europeus em busca de uma saída alternativa não avançaram. O Irã nega ter como objetivo produzir armas atômicas e não aceita suspender o enriquecimento de urânio, como exige a AIEA. "A pesquisa e o desenvolvimento nuclear não serão interrompidos, mas estamos prontos para concordar com um cronograma sobre o enriquecimento de urânio. Esta é a proposta final do Irã para a busca de uma alternativa", disse em Teerã o principal negociador iraniano na área nuclear, Ali Larijani. "Pesquisa e desenvolvimento nuclear são parte do interesse nacional e da soberania do Irã. Não renunciaremos a isso." Aparentemente, a proposta de Larijani significa que o Irã está disposto apenas a retardar o processo e permitir inspeções mais amplas em suas instalações nucleares. Larijani frisou que se os EUA e seus aliados querem usar a força, o Irã seguirá seu próprio caminho, mas não usará o petróleo como arma de pressão. O país tem a quarta maior reserva confirmada do mundo.

Embora documentos aos quais a AIEA teve acesso indiquem que o Irã busca informações sobre enriquecimento de urânio em um nível requerido para armas atômicas, não há provas de que o país tenha um programa armamentista. Além disso, peritos internacionais dizem que o país ainda está num estágio inicial das pesquisas e suas instalações são incipientes (ver ilustração abaixo).

A crise sobre o programa iraniano se aprofundou em janeiro, depois que o país anunciou a retomada das pesquisas para enriquecer urânio. Mas, na avaliação do jornalista da BBC Paul Reynolds, há ainda um longo caminho até a aplicação de sanções pelo CS e pode ser que isso nunca aconteça. Primeiro, o CS deve aprovar apenas uma advertência. Rússia e China têm poder de veto e não apóiam sanções. Ontem, durante palestra num influente comitê pró-Israel, em Washington, o embaixador americano na ONU, John Bolton, afirmou considerar necessidade urgente "confrontar a clara e inflexível posição do Irã" em direção a um programa de armas nucleares.

O governo dos EUA parece dividido. Bolton disse ontem que é muito cedo para falar em sanções, mas ele tem mencionado a necessidade de uma ação militar enquanto a secretária de Estado, Condoleezza Rice, enfatiza a via diplomática. "Ninguém está dizendo que temos de correr imediatamente para algum tipo de sanção", disse Condoleezza.