Título: Após oito meses, CPI perde o fôlego
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/03/2006, Nacional, p. A6

Sem surpresas nem novidades, holofotes e manchetes dão lugar a depoimentos rotineiros, em salas vazias

Vão longe os dias em que os depoimentos e descobertas da CPI dos Correios causavam verdadeiro frisson. Depois de oito meses de funcionamento, os integrantes da comissão se renderam à rotina e ao vazio das sessões. E audiências com platéia lotada de parlamentares, como a protagonizada pelo ex-diretor de Furnas Dimas Toledo há cerca de 15 dias, acabaram virando exceção.

Hoje a CPI é palco de depoimentos enfadonhos e repetitivos conduzidos por sub-relatores - que tocam à margem dos holofotes suas investigações, restritas a três temas: fundos de pensão, contratos e propostas de combate à corrupção. Na prática, as sub-relatorias se transformaram em CPIs particulares em que é comum haver apenas um inquiridor: o próprio sub-relator.

"Os depoimentos tomados pelas sub-relatorias têm uma abrangência específica. São pessoas que não justificam uma reunião do pleno da comissão e, por isso, são ouvidas nas sub-relatorias", explica o presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MS). "As sub-relatorias dão agilidade para a conclusão dos trabalhos e permitem que todos sejam ouvidos."

Às vezes, a falta de participantes na sub-relatoria acaba criando constrangimento para a cúpula da CPI. Foi assim há cerca de três semanas, quando o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), ministro Adylson Motta, foi falar na comissão. Delcídio pretendia apenas participar da abertura da sessão a que Motta compareceu a convite. Mas, constrangido pela falta de platéia para ouvir o presidente do TCU, foi obrigado a comandar os trabalhos durante as quase cinco horas que duraram.

"É natural ter um quórum pequeno nas sub-relatorias porque as pessoas que não estão envolvidas com o processo não acompanham de perto os depoimentos", argumenta o deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS), sub-relator de normas de combate à corrupção na CPI. Criada no fim de dezembro, a sub-relatoria do pefelista já tomou 23 depoimentos. Na maioria deles, o plenário estava às moscas. "A responsabilidade maior é minha, de fazer uma proposta com sugestões para coibir a corrupção", diz Lorenzoni.

Outro que sofre com o vazio de sua sub-relatoria é o deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA), que investiga o uso de recursos de fundos de pensão no esquema de caixa 2 operado pelo empresário Marcos Valério Fernandes de Souza. ACM Neto já ouviu o depoimento de dirigentes de nove fundos de pensão e de duas dezenas de donos de corretoras. "Esses depoimentos estão ajudando muito as investigações apesar de eu ficar sozinho na maior parte do tempo argüindo os depoentes", afirma o deputado. "Não me causa nenhum constrangimento, até porque examinei os dados com as quebras de sigilo dos fundos e das corretoras e levo, em média, duas horas com cada depoente."

O deputado José Eduardo Martins Cardozo (PT-SP), responsável pela sub-relatoria que apura irregularidades nos contratos firmados pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), é outro que se acostumou a ficar sozinho indagando seus convocados.

CONSULTORES

Enquanto os parlamentares nem aparecem na comissão, os depoimentos nas sub-relatorias são acompanhados de perto por consultores do mercado financeiro, preocupados com os reflexos das descobertas da CPI na economia. Um desses consultores, que prefere manter-se no anonimato e faz um relatório diário para seus clientes, revela que no início da CPI o mercado financeiro estava interessado em saber se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria alvo de processo de impeachment. Agora o foco da preocupação voltou-se para as eleições: o mercado quer saber quem será o candidato do PSDB à Presidência e como isso se reflete na disputa política entre tucanos e petistas na CPI.

Para os consultores, o pior já passou e as chances de surpresas agora são pequenas. "Mas o mercado quer saber tudo antes para tomar as decisões e ganhar dinheiro", resume outro consultor.