Título: Lula quer 'abordagem combativa' da esquerda
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/02/2006, Nacional, p. A14

Presidente defende os elementos básicos da cooperação Sul-Sul

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu uma "abordagem mais combativa no plano exterior" da nova esquerda da América Latina. Em entrevista respondida por escrito antes de sua visita à Argélia, publicada nas edições de ontem dos principais jornais do país, Lula ressaltou que a esquerda que subiu ao poder na América Latina "não é irresponsável" e está ciente de que "tem de ser muito cuidadosa" ao lidar com seus desafios internos e aqueles relacionados à globalização. O presidente desembarcou ontem em Argel.

"Temos de ser realistas e lutar não contra a globalização, como Dom Quixote contra os moinhos de vento, mas para redefinir a geografia comercial e econômica mundial, de forma que nos beneficiemos das possibilidades abertas pela globalização", frisou Lula. A possível guinada política à esquerda na América Latina foi observada neste início de ano com as eleições de Evo Morales na Bolívia e Michelle Bachelet no Chile.

Ao destrinchar sua definição da abordagem mais combativa, Lula destacou a necessidade de maior articulação entre as economias em desenvolvimento, como meio de valorizar suas parceiras e de impulsionar a defesa de seus interesses nos foros internacionais. Trata-se do elemento básico da cooperação Sul-Sul, a mola central da política externa de seu governo.

RODADA DOHA

Como argumento, valeu-se do G-20, frente de economias em desenvolvimento que atua em favor de melhores resultados nas negociações da Rodada Doha. Para o presidente, por meio de iniciativas de "grande realismo" como essa, esses países teriam condições de participar mais ativamente e mudar o jogo internacional.

O presidente teve o cuidado de não descartar o Movimento dos Países Não-Alinhados como frente representativa dos interesses do mundo em desenvolvimento - apesar de seu franco processo de desmobilização.

Em suas respostas por escrito, Lula teve especial cuidado de enfatizar que a cooperação Sul-Sul não tem o objetivo de se contrapor aos Estados Unidos ou a outras nações ricas. A advertência teve razão especial - o grau elevado de abertura da Argélia, principalmente em relação às economias européias.

Nesse sentido, destacou que a apresentação do mundo em desenvolvimento como voz organizada e fortalecida foi um dos motivos que o trouxeram a Argel, onde foi recebido ontem com honras militares pelo presidente Abdelaziz Bouteflika.

Lula e Bouteflika reuniram-se por três horas no Palácio Presidencial e presenciaram a assinatura de quatro acordos - sobre comércio, transportes marítimos, cooperação técnica em agricultura e regras sanitárias e fitossanitárias.