Título: O pacote imobiliário
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/02/2006, Notas e Informações, p. A3

O governo elegeu o setor de imóveis como um dos instrumentos para acelerar o crescimento econômico e dar emprego à mão-de-obra pouco qualificada - e para angariar votos para o candidato Lula da Silva.

Em ato político realizado no Palácio do Planalto, o presidente anunciou as medidas contidas no pacote. Para fazer chegar a R$ 18,7 bilhões, o montante das "bondades", o governo incluiu no mesmo bolo recursos públicos e privados. Já se sabia que os agentes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que operam com recursos das cadernetas de poupança, elevariam suas aplicações, de quase R$ 4,8 bilhões, em 2005, para R$ 6,7 bilhões, em 2006. A esse montante serão adicionados R$ 2 bilhões da Caixa Econômica Federal (CEF) - cuja carteira imobiliária com recursos da poupança ficou fechada até o fim de 2005 - , perfazendo R$ 8,7 bilhões.

Mas a maior fatia - R$ 10 bilhões - virá de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), complementados por dotações orçamentárias destinadas a financiar a habitação para a população de baixa renda, inclusive o chamado mutirão, em que a família constrói ou reforma sua casa.

Além disso, a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) cairá de 5% para zero sobre tubos e conexões de plástico, caixas d'água, janelas e portas de madeira, fio-máquina e vergalhões para concreto. E diminuirá de 10% para 5% sobre tintas, vernizes, argamassa, azulejos cerâmicos para piso ou revestimento, vidro e vasos sanitários.

construção é competitivo, essa redução de impostos tenderá a ser transferida para o consumidor. O custo da construção também será menor, permitindo aos construtores, em tese, reduzir o preço pedido pelos imóveis.

A Caixa Econômica Federal, que administra os recursos do FGTS - que por lei são destinados, em boa parte, ao financiamento da habitação -, terá papel predominante no programa anunciado, que prevê a aplicação de R$ 6,8 bilhões do Fundo para a população com renda de até 12 salários mínimos, com prioridade para quem recebe até 5 salários mínimos.

Mais recursos serão destinados às operações com a população de baixa renda, que terá R$ 1,27 bilhão de recursos orçamentários, mais R$ 1 bilhão do Fundo Nacional da Habitação de Interesse Social, criado em 2005. Este fundo tem escopo amplo, podendo financiar não apenas a habitação, inclusive para grupos específicos de mutuários, como idosos, deficientes e famílias chefiadas por mulheres, como o planejamento urbano. Poderá dar frutos em prazo mais curto se se valer da experiência do Programa de Subsídio à Habitação Popular (PSHP), em que os recursos eram leiloados entre as instituições financeiras e chegaram a ter forte participação privada.

O pacote habitacional ora lançado complementa outras medidas já adotadas em favor da construção civil. Em 2005, o governo reduziu o Imposto de Renda sobre o lucro imobiliário, chegando a eliminar o tributo no caso de reaplicação dos recursos em imóvel de igual ou maior valor. E, para melhorar a qualidade dos créditos, o mecanismo da alienação fiduciária - que torna mais fácil retomar o imóvel em caso de inadimplência - passou a ser amplamente utilizado. O patrimônio de afetação também foi regulamentado, com o objetivo de evitar prejuízos aos compradores de imóveis na planta, mas sua aplicação ainda é embrionária.

Nos últimos dias, houve uma queda-de-braço entre os Ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento em torno das dimensões da desoneração tributária. Afinal, o pacote causou frustração entre os que esperavam estímulos fiscais maiores para o setor. Medidas como o crédito habitacional consignado foram adiadas, embora pudessem estimular os empréstimos para muitos trabalhadores, como os funcionários públicos, que têm emprego e renda estáveis.

Apesar das frustrações, não deverão faltar recursos para operações com a classe média e com a população de baixa renda, desde que a Caixa Econômica consiga atingir as metas de aplicação - o que não conseguiu no ano passado. Se os emprestadores forem eficientes, poderá haver um forte aumento da atividade da construção civil, com benefícios reais para o emprego e para o crescimento da economia - e para o candidato Lula da Silva.