Título: "A sociedade concorda com a absolvição"
Autor: Marcelo Godoy
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/02/2006, Metrópole, p. C1,3,4

Entrevista Walter de Almeida Guilherme: Desembargador

O desembargador Walter de Almeida Guilherme, de 61 anos, cujo voto pela absolvição do coronel Ubiratan Guimarães conduziu a maioria dos membros do Órgão Especial do Tribunal de Justiça, esperava ter, de ontem para hoje, um sono "relativamente tranqüilo". "Tranqüilo porque agi de acordo com a minha convicção. Mas intranqüilo porque vou ser criticado e ninguém gosta disso." Consciente da polêmica, arrisca dizer que "a sociedade, de forma geral, concorda com a absolvição".

Desembargador há 9 anos, Guilherme atuou 8 como juiz e 20 como promotor. Diz que tem grande simpatia pelos direitos humanos. "Pedi a condenação de vários integrantes do Esquadrão da Morte", afirmou. Em 2001, votou pela redução de pena do ex-policial miliar Otávio Lourenço Gambra, o Rambo, condenado no caso da Favela Naval, em Diadema.A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como o senhor acha que a sociedade vai reagir à decisão?

Acho que a sociedade, de forma geral, concorda com a absolvição. Mas a crítica é livre. Não decidi sozinho - 19 colegas me acompanharam. Não incuti nada na cabeça deles. Eles votaram igual a mim porque pensam como eu.

O sr. teme ser repreendido?

Temer até temo. Pode ser algum aluno me diga algo. Por isso que a gente é profissional. É difícil ser juiz. A gente é porque tem vocação.

Pode haver reação internacional?Ouvi críticas de que o Brasil pode sofrer sanções da Organização dos Estados Americanos. É um absurdo. Não podemos ter nossa convicção?

Seu voto foi apenas técnico?

Sim. Nem levei voto por escrito. Fiz de improviso, porque conhecia todo o processo. O júri não deveria ter sido questionado sobre excesso. Eles entenderam que ele agiu no estrito cumprimento do dever legal - se é estrito, não é excessivo.

Por que não anular tudo, já que houve contradição no entendimento dos jurados?

Entendemos que quem absolveu foi o júri (ao entender que houve estrito cumprimento do dever). A outra pergunta (sobre o excesso) foi excessiva. Tentei interpretar a vontade dos jurados.

Qual foi o tom da ordem dada pelo coronel Ubiratan?

Pelos autos, um superior dele disse: "O senhor está aí, meça a situação e tome a decisão." Acho que disse para os policiais "entrem lá". Não acho que tenha dito "entrem e matem".

Por que não se entrou no mérito da questão?

Eu queria entrar, mas fui obrigado a me antecipar. Quando o relator afastou todas as nulidades - e essa do excesso era uma -, eu não poderia deixar passar. Era essencial falar da nulidade.

O senhor acha que a decisão pode passar a impressão de impunidade e estimular a violência?

Podem acreditar que a Justiça estaria apoiando policiais que agiram com violência. Pode passar essa idéia, mas eu não gostaria. O Judiciário não protege a polícia em situações violentas.