Título: Opinião: Brasil leva 39 dias para exportar
Autor: Alberto Tamer
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2006, Economia & Negócios, p. B7

Todos sabiam, mas ninguém havia quantificado: as exportações brasileiras levam em média 39 dias para chegar ao porto e serem embarcadas. Com isso, o País perde pelo menos US$ 25 bilhões por ano. Nos Estados Unidos, o prazo entre a saída do produto da fábrica e o embarque é de 12 dias, em média. As estimativas são da Aliança Pró-Modernização Logística do Comércio Exterior - Procomex, após entrevistar dezenas de empresas exportadoras.

"Acreditamos que é possível reduzir esse prazo de 39 dias para 12, média próxima à dos EUA, país que tem características semelhantes às do Brasil", diz Paulo Protásio, da Associação Brasileira de Empresas de Trading (Abece), da Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Carga (Anut) e um dos fundadores da Procomex. A associação está fazendo um mapeamento inédito de todas as etapas do que se chama de "fluxo aduaneiro", uma aduana que inclui autoridades como Anvisa, Ibama e Receita Federal, entre outras. Hoje, esse trâmite dura 39 dias.

Perguntei se ele tinha idéia do número de entidades burocráticas pelas quais tramita o produto a ser exportado. Protásio não tem uma idéia definida, pois o processo de exportação é diferente para cada tipo de mercadoria, origem e destino.

SÓ GANHAMOS DA ÁFRICA

Mas não dá para ter uma idéia, comparar com países com os quais competimos? Protásio citou um estudo da Fundação Getúlio Vargas, que estima as perdas anuais decorrentes do atual "sistema aduaneiro brasileiro" em cerca de US$ 2,5 bilhões. A Dinamarca é o mais ágil: consegue embarcar um produto em 5 dias. Na Coréia, são 12 dias. "O Brasil só é mais veloz que os países pobres da África. No Mercosul, a média é de 30 dias."

NÃO É SÓ INFRA-ESTRUTURA

Geralmente, aponta-se a infra-estrutura precária como uma das causas principais do atraso das exportações. Isso pesa, sim, mas a burocracia talvez pese mais. Um estudo do Banco Mundial (Bird) e da Corporação Financeira Internacional (IFC) concluiu que só um quarto dos atrasos nas exportações dos países é provocado pela infra-estrutura deficiente. Em 75% dos casos, a principal culpada é a burocracia: procedimentos de alfândega, taxas, inspeções de carga.

"Na Dinamarca, é preciso três formulários e duas assinaturas para autorizar a exportação. No Brasil, é preciso juntar sete documentos e oito assinaturas, em média." Para colaborar com o governo, a Procomex, uma iniciativa civil inédita de entidades representativas do setor privado ao poder público, já congrega 62 instituições empresariais.

IMPORTANTE AJUDA, MAS...

A Abece está fazendo um mapeamento de todas as etapas do que se chama de "fluxo aduaneiro", uma aduana que inclui autoridades como Anvisa, Ibama e Receita Federal, entre outras. Hoje, esse trâmite dura 39 dias. "Após a identificação de todas as etapas do processo, importação e exportação, incluindo os documentos exigidos e os procedimentos burocráticos, será iniciada a segunda fase, prevista para agosto, que visa a identificar as mudanças que podem ser feitas, tanto no âmbito normativo como em substituições e alterações nos procedimentos burocráticos, que resultem em ganho de tempo no ambiente aduaneiro", explica Protásio. A terceira etapa consistirá no desenvolvimento e na implantação de um novo sistema, semelhante aos dos países mais competitivos no comércio exterior.

A iniciativa é meritória, pois, mesmo sabendo-se o que bloqueia a expansão do comércio exterior brasileiro, ninguém procurou aprofundar estudos partindo não de análises teóricas, mas da verdadeira batalha que as empresas travam para aventurar-se no mercado exterior. Essa é a razão pela qual é cada vez maior o número das que desistem - ou quebram.

PEQUENOS SÃO GRANDES

Segundo a classificação americana (www.sba.gov), as micro e pequenas empresas respondiam, em 2000, por 31% do valor das exportações dos EUA. E sabem quantas empresas eram responsáveis por essa façanha? 220 mil! E mais: as micro e pequenas empresas representavam naquele ano 99,7% do emprego nos EUA! Não entendo como ninguém em Brasília procurou descobrir o segredo desse modelo. Agora, parece que os exportadores decidiram dar um basta e se responsabilizarem eles mesmos por esse trabalho essencial para um país cujas contas e crescimento econômico dependem do mercado externo.

ESQUECI!

Eu me esqueci de perguntar a Protásio para quem eles vão entregar os resultados do estudo. Afinal, a confusão na área do comércio exterior tem tantos "interlocutores" no meio do caminho que o trabalho pode ter o mesmo destino de tantos outros. Há estudos e propostas que levaram anos para virar projetos de lei e outros tantos para serem regulamentados que acabaram virando alfarrábios nos arquivos do poder.