Título: Economia e eleição
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2006, Economia & Negócios, p. B2

O comerciante Eli da Veiga Vasconcellos não entende por que, apesar do crescimento medíocre do PIB, a política econômica do governo Lula empolga o eleitor, como demonstram as pesquisas de intenção de voto. Vasconcellos não é o único.

Os jornais de domingo reconheciam afinal que "a economia decide eleição". Essa é uma história interessante. O povão, e nessa categoria estão incluídos segmentos das classes médias, reclama tudo o que pode do desemprego e do PIB magrelo, mas, se tiver de escolher entre inflação mais baixa e PIB mais alto, prefere mesmo inflação mais baixa.

Enfim, o que conta em última instância não é o salário potencialmente mais alto que viria junto com eventual galope do PIB. O que conta é a valorização do salário real proporcionado pelo recuo da inflação.

É natural que o empresário, que vive dos estímulos que lhe proporciona o tilintar das máquinas registradoras, prefira crescimento econômico a controle da inflação. O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, por exemplo, está convencido de que os diretores do Banco Central sofrem de certa psicose, que é a obsessão pela derrubada da inflação a qualquer preço.

É bom esclarecer que, do ponto de vista da teoria econômica, inflação baixa e avanço do PIB são forças convergentes. Sem inflação controlada, não há crescimento sustentado. O problema aparece no processo da derrubada da inflação, que não acontece sem algum sacrifício da atividade econômica.

Mas, voltando ao nosso tema, não dá para entender como, neste governo, o presidente Lula seja o único político de primeira grandeza a perceber que o eleitor reconhece com voto a satisfação proporcionada pela queda da inflação. Com as vacilações conhecidas, o presidente Lula fez suas grandes opções nessa direção. Deixou (e até incentivou) que políticos e empresários malhassem os juros altos e a formação do superávit primário de quase 5% do PIB. Mas manteve a linha.

A maioria dos animais políticos que povoa Brasília, a começar pelos que se consideram de esquerda, prefere dizer o contrário. Prefere dizer que, nos conflitos entre crescimento e inflação, a opção deve ser pelo crescimento, não importando a esticada que eventualmente ocorra na inflação.

Essa não foi uma escolha técnica do presidente. Foi escolha eleitoral. Em 1994, enquanto os morubixabas do PT desancavam o Plano Real, o então candidato Lula já tinha entendido que a vertigem proporcionada pelo recuo da inflação se encarregaria de levar o eleitor a escolher seu adversário de então (Fernando Henrique) e de fazer ouvidos moucos ao discurso vazio dos petistas.

Seria bobagem resgatar antecipadamente a dívida do Brasil com o Fundo Monetário Internacional e com o Clube de Paris, como têm dito alguns cartolas do PT? Seria tão mau negócio pagar dívida externa, como têm advertido tantos economistas de esquerda? Pode ser, mas o povo simples não pensa assim. Para ele, o calote é condenável e dívida tem de ser paga, de preferência antes de vencer.

É por isso que, apesar de parlapatices em contrário, o presidente Lula está colhendo e vai colher ainda mais os frutos da decisão de se livrar das dívidas, lógica que tantos políticos não conseguem entender.

Boa parcela da força que o presidente Lula está mostrando nas pesquisas eleitorais tem a ver com a distribuição de 10 milhões de cestas básicas pelo Programa Bolsa-Família, que serão 11 milhões até as eleições e podem estar direta ou indiretamente atingindo mais de 30 milhões de eleitores. No entanto, o resultado dessa política distributivista não teria sido possível se não houvesse arrecadação para ela. E isso também tem a ver com a política econômica.