Título: Governo não muda vale-transporte
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2006, Economia & Negócios, p. B7

Planalto cede a pressões dos sindicatos e desiste de permitir que empresas paguem o direito em dinheiro

O governo cedeu às pressões das centrais sindicais e desistiu de permitir que empresas paguem o vale-transporte em dinheiro. Ontem, o Diário Oficial da União trouxe a Medida Provisória 283, que trata da estrutura funcional de alguns órgãos do governo e, no final, revoga o Artigo 4º da Medida Provisória 280, editada apenas dez dias antes. Esse artigo autorizava as empresas a pagar o vale-transporte em dinheiro ou em tíquetes e garantia que, no caso de pagamento em dinheiro, o valor não seria considerado para cálculo do Imposto de Renda ou da contribuição previdenciária do trabalhador, até um determinado limite.

"Eu não podia admitir que uma conquista de anos dos trabalhadores desaparecesse assim, por medida provisória", disse o senador Paulo Paim (PT-RS), um dos que mais pressionou nos bastidores do governo contra a medida. "Se quiserem mudar o benefício pago ao trabalhador, que enviem um projeto de lei para ser amplamente discutido no Congresso."

A MP 280, que continha a nova regra do vale-transporte, é a que corrige a tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) em 8% a partir de 1º de fevereiro deste ano. A Receita Federal, porém, foi pega de surpresa com a decisão do governo de revogar o dispositivo. "Essa é uma decisão de governo e não cabe à Receita comentar", disse ontem o supervisor nacional do Imposto de Renda, Joaquim Adir.

O objetivo, ao permitir o pagamento dos vales em dinheiro, era facilitar a vida do empregador. "A medida objetiva facilitar o pagamento do benefício, evitando o manuseio físico de grande volume de vale-transporte, que, como valor, fica susceptível a furto", diz a Exposição de Motivos da MP 280, assinada por Murilo Portugal, então ministro interino da Fazenda. A MP passou pelo crivo da Casa Civil, que fez modificações no texto originalmente elaborado pela Receita Federal, e foi editada.

No entanto, seu anúncio provocou forte reação dos sindicalistas.

Segundo Paim, um direito acessório do trabalhador, como é o caso do vale-transporte, quando é convertido em dinheiro, tende a se perder ao longo do tempo. "A experiência mostra isso. Ganhos indiretos acabam embutidos nos salários e, com o tempo, desaparecem." As centrais sindicais também fizeram carga, alegando que o pagamento do vale em dinheiro não protegeria o valor contra reajustes nas tarifas.

Paim esteve com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, pedindo a revogação da medida. Segundo o senador, Bernardo teria se declarado contrário ao dispositivo. As centrais pediram apoio do ministro do Trabalho, Luiz Marinho. "Eu recebi um telefonema da Casa Civil informando que a medida seria revogada", contou o senador.