Título: Átis já mandou Rainha para a cadeia três vezes
Autor: Roldão Arruda e Mônica Bernardes
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2006, Nacional, p. A16

Dos juízes de primeira instância que atuaram em áreas de conflito com o MST, um dos que ganharam mais notoriedade foi Átis de Araújo Oliveira. Na época em que atuou na comarca de Teodoro Sampaio, na região do Pontal do Paranapanema, extremo oeste de São Paulo, ele ficou conhecido sobretudo pelo rigor das decisões contra integrantes do movimento.

Entre 2002 e 2003, atendendo a solicitações da promotoria, ele expediu 48 mandados de prisão contra líderes dos sem-terra. Em pelo menos três ocasiões, mandou para a cadeia o principal líder na região, José Rainha Júnior, e, em outra, sua mulher, Diolinda. Num dos processos, em que decretou a prisão preventiva de Rainha e outros quatro líderes, após a invasão da Fazenda Santa Maria, em junho de 2000, ele consignou: "A cada invasão promovida pelo MST, através de suas lideranças, a massa anônima é levada também ao cometimento de infrações por essas lideranças que os comandam... Ora, não reprimir tal situação é dar verdadeiro aval para que a massa entenda que possa praticar qualquer ato que seja, tais como: furtos, depredações, cárceres privados, saques de caminhões, bloqueios de estradas..."

Para o juiz, que foi promovido para o Juizado Especial Cível de Presidente Prudente, "o Estado, em situações como esta, não pode deixar de usar seu poder de império, sua força, sob um falacioso argumento de evitar cair em autoritarismo".

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concordou com o juiz, indeferindo o pedido de habeas-corpus impetrado por advogados do MST. O movimento recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), com pedido de liminar. Na análise desse pedido, o relator, ministro Paulo Gallotti, em despacho de agosto de 2003, concordou com a decisão do juiz de primeira instância e negou a liminar. "No regime democrático, inegavelmente o vivido em nosso País nos dias de hoje, não se justifica que determinados grupos pretendam fazer 'justiça pelas próprias mãos', ou, segundo seu enfoque próprio, instalar parcelamento rural, invadindo terras a seu bel-prazer, loteando-as e outorgando falsa posse a terceiros, sem obediência às normas governamentais."

Mas, no julgamento do habeas-corpus, o ministro Paulo Medina manifestou entendimento totalmente diverso, ao suspender a ordem de prisão: "Os pacientes são obreiros rurais integrantes do MST, que lutam e sacrificam-se por mais razoável meio de vida, onde a dignidade social somente pode ser restaurada no momento em que se fizer a verdadeira, necessária e indispensável reforma agrária no País."

O advogado Roberto Rainha, assessor jurídico do MST e irmão do líder José Rainha Júnior, disse que alguns integrantes do Judiciário e do Ministério Público no Pontal não exercem a imparcialidade que deveriam. "Alguns desses promotores são de famílias de fazendeiros e tiveram origem no latifúndio que o movimento combate."

O presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Luiz Antonio Nabhan Garcia, queixa-se do tratamento dado pelos tribunais superiores, especialmente o STJ, nas ações que envolvem os sem-terra. "É um tratamento político, que não contribui para reduzir as tensões no campo." Para ele, os juízes de primeira instância têm uma visão mais isenta do problema.