Título: Moldura de Picasso surge em favela do Rio, queimada
Autor: Rodrigo Morais
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/03/2006, Metrópole, p. C3

PF localizou peça entre restos de fogueira; pintura de Matisse, também roubada de museu no carnaval, foi posta à venda em site no exterior

A Polícia Federal localizou ontem pedaços da moldura do quadro A Dança, de Pablo Picasso, roubado do Museu Chácara do Céu, em Santa Teresa, centro do Rio. Os fragmentos estavam nos restos de uma fogueira, no Morro dos Prazeres, no mesmo bairro. Também ontem, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) foi informado de que o quadro Jardim de Luxemburgo, de Henri Matisse, roubado no mesmo assalto, foi oferecido em um site de leilões virtuais da Bielo-Rússia, o que levou a PF a acionar a Interpol. O lance mínimo seria de US$ 13 milhões.

Também foram levadas, na sexta-feira, por quatro homens armados, as obras Os Dois Balcões, de Salvador Dalí, e Marine, de Claude Monet. Os quadros são avaliados em US$ 50 milhões.

Foi por meio de um telefonema ao Disque-Denúncia que a PF, com apoio da Polícia Civil, chegou às molduras queimadas. A diretora da Chácara do Céu, Vera de Alencar, confirmou que um dos fragmentos apresenta o número de série do quadro de Picasso.

Ela disse que outro pedaço de moldura, aparentemente, seria do quadro de Dalí. Quando viu os restos, pensou que as obras tivessem sido destruídas também e chegou a chorar. Depois, constatou que não havia resíduos das telas entre o material queimado. "Minha sensação foi de total perplexidade. É uma coisa terrível ver obras desse valor, não só financeiro, tratadas dessa maneira", disse. "Dá para perceber que as telas foram retiradas. Tomara que eles (os ladrões) tenham feito isso."

O delegado federal Elias Escobar, que chefiou a operação no Morro dos Prazeres, contou que os restos de pelo menos três molduras estavam num terreno baldio, na favela. A investigação indica o envolvimento de pessoas ligadas ao tráfico de drogas no crime. Escobar e o também delegado federal Deuler Rocha chegaram a afirmar que havia resíduos da tela de Picasso entre o material queimado, mas logo voltaram atrás.

O quadro de Matisse foi oferecido durante quatro horas na página www.art.mastak.by/auctiondetails.php?id=14. A informação chegou ao Iphan por uma mensagem eletrônica. O diretor do Departamento de Museus do instituto, José do Nascimento Júnior, acredita que uma quadrilha internacional está por trás do crime. E disse que o roubo representa uma alteração no modo como agem os bandos que roubam bens culturais. "Vamos mudar o padrão de segurança dos museus."

A deputada Alice Portugal (PC do B-BA) esteve no museu ontem e quer a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o tráfico de bens culturais. Ela lembrou que o site do Iphan apresenta uma lista de 900 obras roubadas no País. "Isso é tráfico, é crime organizado." Entre as medidas que a deputada defende está a criação de uma campanha para estimular pessoas que tenham comprado obras roubadas, às vezes inadvertidamente, a devolvê-las. Ontem, foi feita a reconstituição do roubo.