Título: O programa tucano
Autor: Suely Caldas
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/02/2006, Economia & Negócios, p. B2

Com chances reais de chegar à Presidência da República, os dois candidatos tucanos têm intensificado conversas reservadas com economistas para formatar seus programas de governo. Além de Luiz Carlos Mendonça de Barros, que divulgou suas idéias em entrevista ao Estado (15/1), o governador Geraldo Alckmin aconselhou-se com o ex-secretário de Fazenda de São Paulo Yoshiaki Nakano e o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que levou para o encontro Ilan Goldfajn e Amaury Bier, ambos com experiência de gestão pública recente. Estilo concentrador e com idéias próprias, José Serra é mais arredio ao debate, mas tem conversado com Edmar Bacha, de quem divergiu todo o tempo no governo FHC, mas ouve pela influência de argumentos que o economista exerce sobre os caciques do PSDB - FHC e Tasso Jereissati. Em recente entrevista ao Estado (18/12), Bacha deixou claro: seja quem for o candidato tucano escolhido, vai assumir o programa econômico definido não por ele isoladamente, mas pelo partido. Aliás, o que é natural.

O momento agora é mais de indagar do que responder. E são três as perguntas recorrentes dos dois candidatos nas conversas: como reduzir juros, desvalorizar o câmbio e fazer o País crescer a taxas elevadas. São mais efeitos do que causas, portanto, há de atacar o que vem antes, ouviu Alckmin. O quê? Trata-se de um velho e persistente dilema: os governos gastam mais do que podem e no que deveriam economizar - em despesas correntes, viagens, diárias, reformas de palácios, construção de prédios, compra do Aerolula. Desperdiçam dinheiro e pouco aplicam em investimentos voltados para o progresso econômico e social da população. Exemplo: em 2005 o governo Lula elevou em 10% seus gastos correntes, quase o dobro da inflação, e os investimentos ficaram com menos de 1% do orçamento. Além disso, o explosivo déficit da Previdência vai exigir uma reforma no início de 2007, ganhe PSDB ou PT. Do contrário vai ser difícil governar.

São temas desagradáveis que os candidatos evitarão falar na campanha, mas sabem que terão de enfrentar no governo. Outro polêmico tabu que tem o bom efeito de depreciar o câmbio e controlar a inflação é ampliar a abertura comercial, reduzindo tarifas de importação. É tudo o que os empresários da Fiesp e do Iedi abominam, nem querem ouvir falar, pois temem enfrentar a concorrência com produtos importados mais baratos. No câmbio eles gostariam da volta ao paternalismo do passado - a intervenção artificial do Banco Central, desvalorizando o real por um ato de força. Seria um retrocesso estúpido! Defendida por Edmar Bacha e Armínio Fraga, a proposta de ampliar a abertura da economia - que Lula evitou por pressões corporativas do empresariado paulista - foi feita aberta e publicamente por Luiz Carlos Mendonça de Barros, que bem conhece a reação furiosa da Fiesp e IEDI à idéia. E Geraldo Alckmin parece concordar com a proposta ao afirmar esta semana que "se o Brasil quiser crescer, terá de apostar na inserção internacional de forma mais aprofundada e ampliar enormemente o comércio exterior".

Se concordam com a abertura comercial, Armínio Fraga e Mendonça de Barros discordam em relação ao regime cambial. Mendonção fala em mudança de regime; não define o que seria e, quando pressionado, no máximo menciona a "flutuação suja do câmbio", sem dizer em que situações o Banco Central interviria. Mas confia no poder do aumento das importações para desvalorizar espontaneamente a moeda.

O que fazer com a enorme dívida interna, que passou de R$ 1 trilhão no governo Lula, será um importante item do programa. Edmar Bacha quer desindexá-la da taxa Selic, substituindo as LFTs por papéis com juros pré-fixados e pagando um pequeno ágio para incentivar o investidor a aceitar a mudança. Mendonção concorda com Bacha e sugere indexar os títulos do governo ao IPCA. Há dias surgiu uma nova proposta, do ex-ministro Bresser Pereira, de trocar as LFTs por papéis remunerados a uma taxa de 5% ao ano, o que implica perda para os credores da dívida de pelo menos 10%, se confirmada a previsão do mercado de a Selic encerrar 2006 a 15%. "Parece calote", reage Armínio Fraga. "Bresser ficou maluco", concorda Mendonção, imaginando o caos que tal idéia provocaria no mercado financeiro.