Título: 'BC não contrariou a esperada decepção'
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2006, Economia & Negócios, p. B4

O corte de 0,75 ponto porcentual na taxa Selic decepcionou o empresário Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Para ele, a taxa determinada pelo Copom representa um forte garrote sobre o desempenho da economia.

O que o sr. achou da decisão do Copom?

Não contrariou a esperada decepção. Ela sempre ocorre em todas as reuniões do Copom. Não vejo motivos para que não seja alterado o ritmo de redução da Selic, uma vez que todos os indicadores são extremamente positivos.

Quais podem ser os efeitos disso?

Acho que é uma questão de o quanto você usufrui de espaço. O espaço que pode ser usufruído pela economia brasileira é maior que o que está aí. Essa decisão só coloca o mesmo tipo de limitação à taxa possível de expansão da economia brasileira. Não tenho dúvidas de que vamos ter este ano uma taxa melhor que a do ano passado. Ela será influenciada pelos múltiplos aspectos de um ano eleitoral. Pode chegar, talvez, a 4%, só que poderia ser 6%.O Banco Central e a taxa de juros por ele determinada têm sempre um aspecto muito forte de garrote sobre o desempenho econômico.

Por que o BC insiste nessa posição conservadora?

Eu tentei várias vezes entender a lógica do Banco Central e não consegui. Acho que eu não sou o único, porque ele está praticamente isolado na sua lógica. A maioria dos economistas, grande parte do governo e toda a produção pensam de forma diferente do BC. Os anseios da sociedade também são diferentes. A inflação dá mostras de uma tranqüilidade muito grande, incapaz de causar susto ou temor. A lógica do Banco Central, de que é necessário manter esse ritmo de queda da taxa Selic, é uma lógica própria, muito difícil de ser entendida.

A questão eleitoral poderá levar o governo a pressionar o Copom a acelerar a queda dos juros?

Acho que não. O Copom ganhou um status de autoconfiança que permite a ele se abstrair de toda a realidade que o cerca. Isso é complicado, porque já houve ocasiões anteriores em que era claro para todo mundo que a decisão do Banco Central contrariava a expectativa do próprio governo de que ele faz parte, que queria mais ousadia. A maioria dos ministérios que compõem o governo, aqueles de maior peso, não concorda com o Banco Central. Talvez o único que concorde, por dever de ofício, seja o da Fazenda. Não acredito que o presidente Lula esteja satisfeito e feliz quando viu o crescimento de 2,3% do PIB do ano passado. Ele deve ter ficado muito bravo porque o enganaram . Nada disso faz com que o Banco Central mude a sua postura.

Como o presidente foi enganado?

Se o presidente falou durante o ano que haveria um crescimento (econômico) de 4%, e chegou até a mencionar 5%, é porque alguém disse a ele. Se depois deu 2,3%, é porque alguém o enganou.