Título: Acordo na Câmara salva mandatos de Brant, do PFL, e Luizinho, do PT
Autor: João Domingos e Denise Madueño
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2006, Nacional, p. A4

Já não são apenas rumores. O acordão entre parlamentares da base do governo e da oposição para salvar alguns mensaleiros da cassação se tornou ontem um fato concreto. Em uma jornada de pouco mais de sete horas, em duas votações, o plenário da Câmara livrou tanto o oposicionista Roberto Brant (PFL-MG) quanto o governista Professor Luizinho (PT-SP). O pefelista foi absolvido por 283 votos a favor, 156 contrários, 18 abstenções e 1 em branco. O petista salvou o mandato por 253 votos contra 183 a favor, com 10 abstenções e 3 votos em branco. O placar do escândalo do mensalão já registra 4 para o time dos absolvidos e 2 para a equipe dos cassados.

Único parlamentar de oposição a enfrentar processo de cassação no escândalo do mensalão, Brant disse que não será mais candidato a nada. Luizinho salva o atual mandato pronto para disputar um novo na eleição de outubro.

Luizinho é o primeiro petista suspeito de participar do mensalão a ser absolvido. Dos 18 acusados de envolvimento com o valerioduto, além de Luizinho e Brant, foram absolvidos Sandro Mabel (PL-GO) e Romeu Queiroz (PTB-MG) e cassados Roberto Jefferson (PTB-RJ) e José Dirceu (PT-SP). Renunciaram ao mandato para fugir do processo Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos Rodrigues (sem partido-RJ), José Borba (PMDB-PR) e Paulo Rocha (PT-PA).

AMOR PRÓPRIO

Primeiro a enfrentar o plenário, Brant gastou 36 minutos para fazer sua defesa. Fez um discurso voltado para o amor próprio dos parlamentares. Deu certo. Quando encerrou, foi aplaudido de pé por companheiros de partido e parlamentares governistas, entre eles dezenas de petistas, como o líder do PT, Henrique Fontana (RS), e o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (SP), este também processado por quebra de decoro e com possibilidade de perder o mandato.

Ele afirmou que em 2004 recebeu do presidente da Usiminas a oferta de R$ 150 mil para sua campanha a prefeito de Belo Horizonte. Foi informado de que o dinheiro seria repassado pela agência de publicidade da empresa, a SMPB, de Marcos Valério. "De fato, duas ou três semanas depois, recebi um telefonema do presidente da agência, o senhor Cristiano Paz, e não Marcos Valério, como dizem por aí, que informou ser a quantia de R$ 102.810,76, e não R$ 150 mil, porque havia a comissão da empresa e os impostos." Brant continuou: "Esse dinheiro serviu para pagar um programa de televisão de 20 minutos que foi ao ar no dia 30 de maio. Não fiquei com um centavo. Não prestei contas porque não sou presidente nem tesoureiro do PFL."

SHAKESPEARE

Culto, Brant pontilhou sua defesa com citações filosóficas e encerrou sua defesa citando outro filósofo contemporâneo. "O grande André Malraux dizia, de maneira pungente, que os homens não conhecem as palavras com as quais podem expressar as suas dores mais profundas. É verdade. Por isso, eu passei quase todo esse tempo mais ou menos em silêncio. Agora, eu tenho de confessar: a amargura tocou a minha alma, com seus dedos frios, atravessou com pungência. E dentro de mim nasceu um deserto, com o qual eu vou viver para sempre."

APRENDIZADO

Em sua defesa, ao contrário de Brant, Luizinho fez um discurso rápido, em que pediu pela absolvição. "O aprendizado obtido no processo no qual a solidão da alma é a busca incessante da luz para reconstituir o processo da dor vivida é sobre-humano, mas vale a pena, quando se confia nas mulheres e homens que nos olham, que sob a luz dos mandamentos da Justiça e com o acompanhamento de Deus darão seu voto", ressaltou ele.

Um possível acordo entre PT e PFL para livrar parlamentares da cassação foi negado o tempo todo pelos dirigentes dos dois partidos. Mas o PT votou pela absolvição de Brant, que fora julgado quatro horas antes. No caso de Professor Luizinho, o deputado Mussa Demis (PFL-PI) assumiu a aberta defesa do colega. "Não podemos condenar injustamente inocentes como Luizinho. Vamos absolver o Professor Luizinho, para que ele volte para o seio de sua família." O deputado João Batista Araújo, o Babá (PSOL-PA), acusou PT e PFL de fazerem o acordo. "Está na cara que fizeram uma aliança para absolver todo mundo", insistiu Babá, em discurso no qual pregou a cassação de Luizinho.