Título: Para Lula, donas de casa inspiram o seu governo
Autor: Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/03/2006, Nacional, p. A15

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conclamou ontem os empresários britânicos a investirem no Brasil usando um argumento insólito: como as donas de casa, o governo só gasta o que tem; e essa e outras políticas de sua gestão estão levando o País a viver um período de crescimento "sustentável e duradouro" inédito na história.

O presidente não mencionou o déficit que o governo brasileiro tem registrado todos os anos, apesar de suas contas serem positivas antes de considerados os juros. Também não disse que as taxas de crescimento da economia em sua gestão - em média, 2,6% anuais - são incomparavelmente mais baixas do que as experimentadas, por exemplo, durante o chamado milagre econômico do fim dos anos 60 e início dos 70.

Lula explicou que a origem de um princípio básico que teria adotado no governo saiu da economia doméstica. "A primeira decisão nossa foi uma decisão sábia, não aprendida em nenhuma universidade ou curso de pós-graduação em economia, mas aprendida com milhões de donas de casa, de mulheres que, para fazer compra com o salário do marido, nunca ousaram gastar mais do que podiam", afirmou. "Gastamos apenas aquilo que podemos gastar para que possamos ter um pouco mais de investimento."

Segundo o presidente, a atual gestão nunca brincou com a economia. Hoje, colhe os bons resultados do que plantou, com o País tendo todas as condições para receber investimentos. Em determinado ponto do discurso, Lula ressaltou que, para os ingleses voltarem a investir com mais intensidade no Brasil, "não basta a eleição de um presidente ou a escolha de um ministro da Fazenda".

"Nunca reunimos um crescimento sustentável e duradouro de longo prazo como estamos fazendo agora", disse. "Acreditamos que, mais do que ninguém, precisamos nos consolidar, enquanto economia forte, e mostrar que somos capazes de cumprir nossos contratos."

EXPORTAÇÕES

A capacidade para exportar também apareceu no discurso presidencial, mas com uma objeção. "Não descansaremos enquanto não chegarmos ao ponto de exportar o que o Brasil tem de mais sagrado, que é a inteligência do povo brasileiro", explicou o presidente.

Apesar do entusiasmo do presidente, o Duque de York, o príncipe Andrew, ao discursar no evento, observou que China e Índia são hoje os "candidatos mais óbvios" a se tornarem potências econômicas mundiais, sendo "seguidos de perto por Brasil, México e Coréia do Sul".

Mais tarde, ao ser homenageado com um jantar no centro financeiro de Londres, Lula disse esperar um ano tranqüilo na economia, apesar das eleições. "O Brasil goza de solidez institucional que nos permite encarar com tranqüilidade um ano como este, marcado por eleições gerais", explicou.

AGENDA CHEIA

No segundo dia de sua visita oficial à Inglaterra, o presidente Lula e seus acompanhantes tiveram uma agenda cheia. De manhã, Lula recebeu o polêmico prefeito de Londres, Ken Livingstone - que já comparou um jornalista de origem judaica a um militar de campo de concentração e deflagrou uma guerra contra os pombos que sujam a Praça Trafalgar, um dos cartões-postais da cidade.

A comitiva visitou o Parlamento britânico, onde Lula ressaltou a importância do Poder Legislativo nos regimes democráticos. O lord chancellor (que é o presidente da Câmara dos Lordes), Charles Falconer, cometeu uma pequena gafe. Ao tentar falar em português o nome da sede do Parlamento inglês, referiu-se a ele como "palócio" de Westminster. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, não conseguiu conter o riso.

O presidente Lula também inaugurou uma mostra sobre a Tropicália, com direito a conversa telefônica com o técnico da seleção brasileira de futebol, Carlos Alberto Parreira, além de ter participado de seminário que reuniu empresários dos dois países e de um jantar com o prefeito da Corporação de Londres, David Brewer.