Título: Marqueteiros buscam a vida depois do mensalão
Autor: Luciana Nunes Leal, Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/02/2006, Nacional, p. A7

Exemplos baratos e bem-sucedidos de campanhas feitas no passado são garimpados; especialistas em TV discordam quanto à redução de gasto

Os especialistas em marketing político tentam se adaptar aos tempos de aparente austeridade, divididos entre a preocupação com a imagem arranhada e a expectativa pelo fechamento de novos contratos com partidos e candidatos. Com os dois papas da propaganda política, os baianos Duda Mendonça e Nizan Guanaes, fora do cenário, um dos indicadores para a nova fase que o setor vive é buscar exemplos em campanhas passadas relativamente baratas e bem-sucedidas.

Apesar da ordem de manter a contenção e discrição, profissionais ouvidos pelo Estado confessam que "há gordura para cortar", mas que a produção de TV é sempre cara e quem economizar demais sairá perdendo. Um programa completo de TV, de 20 minutos e alta qualidade, não sai por menos de R$ 300 mil. Na definição de um antigo colaborador de Duda e Nizan, na campanha de 2006 "tudo será milimetricamente planejado para parecer simples".

MUDANDO O DISCURSO

"Passei anos dizendo que o setor publicitário nunca se envolveu em escândalos. É claro que mudei o discurso", diz o presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), Dalton Pastore. Segundo ele, das 4 mil agências de publicidade brasileiras, "menos de 4" trabalham para o governo federal e um número ainda menor faz campanhas. "Nosso calvário hoje é a publicidade de governo e política", admite ele.

Responsável pela campanha vitoriosa do "não" no referendo sobre desarmamento, no ano passado, Chico Santa Rita é defensor de campanhas "mais econômicas, sem grandes arroubos". Ele não critica Duda, mas reclama: "Acho uma pena que esse tipo de coisa tenha colocado o conceito do marketing político em xeque".

Um experiente profissional de marketing político aponta que a campanha deste ano será marcada pelo patrulhamento entre adversários, na tentativa de flagrar dinheiro ilegal e gastos não declarados.

O publicitário Orlando Pacheco condena a proposta em discussão no Congresso de proibir filmagens externas na propaganda política: "É uma balela. Quem tiver dinheiro pode montar um estúdio hollywoodiano", diz.

Para Luiz Fernando Carvalho, diretor do filme Lavoura Arcaica e das minisséries Os Maias e Hoje é dia de Maria, o que se faz na propaganda política de TV é "lixo". Ele duvida que haja mudança de conteúdo em 2006: "Com ou sem caixa 2, trata-se de um modelo ultrapassado, onde mensagens e mais mensagens enganosas continuarão sendo empurradas goela abaixo da população", opina.

Roteirista do série A Grande Família, da TV Globo, o humorista Cláudio Paiva acredita que programas políticos menos espetaculosos estão a caminho: "O espectador é sensível a boas idéias e elas devem começar no próprio projeto do candidato", diz.

O sociólogo e jornalista Laurindo Leal Filho, professor da USP e fundador da ONG TVer, que avalia a qualidade da televisão brasileira, ao contrário de Pacheco, acredita que a restrição a imagens externas vai ajudar a diminuir o custo da propaganda política. "Como a TV aberta é de alta qualidade técnica e estética, os programas políticos buscaram esse padrão, mas transformaram a política em espetáculo", assinala ele.

Um caso emblemático, para Leal, foi o Fura-Fila criado por Duda Mendonça para a campanha do Celso Pitta à prefeitura de São Paulo em 1996: "Chegou ao limite da fantasia. Infelizmente, só os fatos do caixa 2 é que levaram à revisão desses programa", diz o professor.