Título: Pílula de cálcio não evita osteoporose
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Fonte: O Estado de São Paulo, 17/02/2006, Vida&, p. A15

Suplementos amplamente receitados podem oferecer uns poucos benefícios. E somente para algumas mulheres

Um amplo estudo realizado ao longo de sete anos com mulheres de mais de 50 anos não revelou nenhum benefício no uso de suplementos de cálcio e vitamina D para prevenir a osteoporose, apesar do endosso generalizado dos médicos.

A osteoporose é uma doença marcada pela diminuição progressiva da massa e da qualidade dos ossos e, conseqüentemente, pelo aumento do risco de fraturas. Atinge com mais freqüência as mulheres a partir da menopausa, período em que o organismo feminino passa a produzir menos estrogênio, hormônio que estimula a formação da matriz óssea. Para repor essa perda, os médicos receitam doses diárias de cálcio e vitamina D. Se a fonte única de cálcio fosse o leite, seria necessário tomar mais de 1 litro por dia.

O estudo, no entanto, descobriu benefícios dos suplementos de vitamina D e cálcio em alguns subgrupos de mulheres. O único efeito positivo na população estudada como um todo - 36.282 mulheres saudáveis com idades de 50 a 79 anos - foi um aumento de 1% na densidade óssea do quadril.

O estudo, que consumiu US$ 18 milhões (R$ 38,5 milhões), fez parte da Women's Health Initiative, o mesmo projeto americano que surpreendeu a comunidade médica mundial na semana passada ao concluir que dietas com pouca gordura não protegem contra doenças cardíacas e contra os cânceres de mama e colo-retal.

Em ambos os casos, os estudos contradizem as crenças populares e suscitam questões sobre a validade das recomendações de saúde dos governos para a população.

No estudo mais recente, uma parte das participantes foi orientada a tomar mil miligramas de cálcio e 400 unidades internacionais de vitamina D por dia. A outra parte tomou placebo. Todas foram acompanhadas por sete anos. Os pesquisadores analisaram a densidade óssea, os casos de fratura e o aparecimento de câncer de colo-retal.

O estudo, além de verificar que não houve diminuição no número de fraturas no quadril, não revelou nenhum sinal de que os suplementos podem evitar o câncer de colo-retal. Além disso, apontou para a existência de um risco aumentado de pedras nos rins.

A ausência de efeitos no câncer de colo-retal foi tão clara que provocou pouco debate. No caso do efeito nos ossos, a história foi outra. Especialistas em osteoporose disseram que o estudo, publicado ontem na prestigiosa revista médica New England Journal of Medicine, provavelmente colocou areia na corriqueira prática médica de recomendar que todas as mulheres tomem suplementos de cálcio e vitamina D a partir da menopausa - às vezes antes, como uma forma de prevenção contra a osteoporose.

Estatísticas americanas mostram que, das mulheres com mais de 65 anos com osteoporose, 50% sofreram fratura por causa da debilidade dos ossos.

SUBGRUPOS

Os pesquisadores ressaltaram alguns indícios animadores. Quando observaram somente as mulheres que seguiram à risca as orientações médicas - isto é, tomaram 80% dos comprimidos -, os suplementos reduziram as fraturas do quadril em 29%. A taxa anual de fraturas em mulheres que tomaram os suplementos foi de 10 por 10 mil, ante 14 por 10 mil nas que tomaram placebo.

Numa análise separada do subgrupo de mulheres com mais de 60 anos, os pesquisadores notaram uma redução de 21% nas fraturas de quadril no grupo que tomava os suplementos. As taxas foram de 19 por 10 mil nas que tomaram os suplementos, e de 24 por 10 mil nas que tomaram placebo.

Mas essas análises de subgrupos são questionadas por muitos estatísticos para os quais, num estudo grande, sempre haverá subgrupos mostrando um efeito ou outro, de acordo com as conclusões a que se deseja chegar.

Apesar dos resultados gerais, nem mesmo os próprios pesquisadores condenam o uso de suplementos de cálcio e vitamina D. De acordo com a médica Elizabeth G. Nabel, que coordenou a pesquisa, o aumento da densidade óssea e os resultados do subgrupo de mulheres com mais de 60 anos são suficientes para comprovar o valor do cálcio e da vitamina D. "Com base nisso, as mulheres deveriam considerar a possibilidade de tomar suplementos", afirma ela.