Título: ONU pede o fim de Guantánamo
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/02/2006, Internacional, p. A14

Relatório da entidade dá duas opções os EUA: submeter todos os prisioneiros a julgamento ou libertá-los

Peritos da ONU dão duas opções ao governo dos EUA: ou julgam os prisioneiros mantidos na base militar de Guantánamo ou libertam todos. Ontem, cinco especialistas das Nações Unidas divulgaram um relatório preparado durante seis meses sobre o tema. Parte do conteúdo do relatório havia vazado nos EUA no início da semana e pede o fechamento imediato da prisão em território cubano. O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, defendeu ontem o fechamento da prisão "o quanto antes".

Os peritos que realizaram a investigação optaram por não ir até a prisão porque o governo americano os impediu de ter acesso aos detentos sem o acompanhamento de um representante de Washington. Para a Casa Branca, essa era uma exigência inegociável, sob a alegação de que apenas o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) tem direito de visitar os presos sem a companhia de uma autoridade americana. No caso do CICV, reclamações e queixas sobre as condições da prisão são mantidas em sigilo e informadas apenas ao país envolvido. A ONU lembra que todos os países que recebem os peritos têm por tradição permitir o acesso irrestrito dos investigadores a todos os locais.

A avaliação sobre Guantánamo, portanto, foi feita a partir de informações de organizações não-governamentais, advogados de presos e entrevistas com ex-prisioneiros da base e que hoje estão na Espanha, Inglaterra e França.

Uma das acusações da ONU é a de que manter prisioneiros por anos sem julgamento se constitui em prisão arbitrária, o que seria ilegal pelas normas internacionais. Alguns dos detentos estão presos desde os ataques americanos no Afeganistão, há quatro anos. Para a ONU, direitos à saúde mental e física estão sendo violados.

Os investigadores defendem a liberação imediata dos prisioneiros e destacam que os suspeitos têm o direito de reivindicar legalmente sua libertação. Em alguns casos, os prisioneiros já começaram a ser julgados.

Mas mesmo assim a ONU alerta que o procedimento é irregular, uma vez que o governo americano atua como "juiz, promotor e advogado de defesa", violando garantias de todos a terem um processo justo.

O governo americano reagiu e alegou que os representantes da ONU não podem emitir tais opiniões se nunca foram ao local. Para a Casa Branca, as conclusões do relatório são "sem mérito e não se baseiam nos fatos".

As preocupações dos peritos vão além. Para a ONU, há indícios de prática de tortura na base. Os especialistas ainda lembram que governo americano está tentando redefinir o que é tortura para permitir o uso de algumas práticas de intimidação nas prisões. Para combater a greve de fome de alguns detentos, por exemplo, os militares americanos estariam inserindo sondas nos prisioneiros para alimentá-los.