Título: "Quem apostar na divisão do PSDB vai errar"
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/02/2006, Nacional, p. A6

Geraldo Alckmin, governador de São PauloEntrevistaO governador Geraldo Alckmin reiterou ontem sua decisão de disputar a candidatura do PSDB à Presidência e rejeitou a noção de que os tucanos estão se atrasando para tomar uma decisão. Aconselhou Lula a "preocupar-se mais com as questões de gestão" do governo do que com a briga dos tucanos, mas evitou responder à crítica de um importante aliado, o senador José Jorge (PE), vice-presidente do PFL, que o acusou ontem de criar muita dificuldade para a candidatura do prefeito José Serra.

"Não ouvi a declaração", esquivou-se. Ao mesmo tempo, prometeu apoiar o prefeito caso perca a disputa. "Se Serra for o escolhido, terá meu total apoio", garantiu. Mas, se for ele o candidato tucano, disputará o Planalto "não para ser mais um presidente".

Alckmin falou ao Estado depois de reunir-se com o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento, Luiz Alberto Moreno, e assinar um contrato de crédito de US$ 9 milhões para um programa de preservação da Mata Atlântica por meio do desenvolvimento do ecoturismo nos parques estaduais da floresta. A exemplo de Serra, que esteve na capital americana há duas semanas, o governador também visitou o presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz. Mas, em busca de mais visibilidade, seu roteiro incluiu um encontro com o secretário de Comércio dos Estados Unidos, Carlos Gutierrez, e com a embaixadora Susan C. Schwab, uma das vices do representante de comércio da Casa Branca, Robert Portman, e responsável pelas negociações comerciais com os países do hemisfério. O governador almoçou na residência oficial do embaixador do Brasil em Washington, Roberto Abdenur, e com um grupo de americanos que se interessa pelo Brasil, entre eles a ex-embaixadora americana em Brasília Donna Hrinak.

O presidente Lula ironizou a disputa interna entre os tucanos pela candidatura ao Planalto dizendo que, para ele, lembra o PT dos anos 80.

O presidente devia preocupar-se mais com as questões de gestão do governo do que com o quintal do vizinho.

Um aliado do PSDB, o senador José Jorge, vice-presidente do PFL, criticou sua pretensão de ser o candidato à Presidência dizendo que está criando muita dificuldade à candidatura de José Serra.

Prefiro não comentar a declaração porque não a ouvi.

Está satisfeito com os critérios e a forma com que seu partido vem conduzindo a escolha do candidato do PSDB ao Planalto?

Nosso presidente, Tasso Jereissati, o Aécio e o Fernando Henrique têm toda a experiência para conduzir bem esse processo. Quem apostar na divisão do PSDB vai errar. Não há razão para fazer correria. A convenção partidária é só em junho. Nós teremos de decidir em março em razão do prazo de desincompatibilização. Acho que há uma grande probabilidade de um entendimento, de nem haver disputa e de o partido manter-se unido para trabalhar pelo Brasil.

Se o escolhido for Serra o senhor o apoiará plenamente?

É obvio.

E espera dele o mesmo tipo de apoio se for o escolhido?

Claro. O prefeito José Serra terá meu apoio total e integral se for o escolhido. O fato de o PSDB ter várias e boas opções é extremamente positivo. Mostra que o partido tem quadro, tem time para governar.

Mas a crítica é justamente que o time tucano está demorando para entrar em campo e, enquanto isso, o outro time está jogando sozinho e fazendo gol.

Eu não vejo isso com tanta preocupação. Primeiro porque a campanha só vai começar depois de junho. Campanha antes de julho é ilegal.

Mas é real.

Mas é uma ilegalidade, sujeita a multas e punições. Segundo, porque, na prática, a campanha só vai começar quando mudar o horário da novela. Até agosto, não vai acontecer absolutamente nada, a não ser as conversas políticas, a negociação das alianças e preparação. A tarefa mais importante agora, e eu pretendo me debruçar sobre ela integralmente, uma vez definida essa questão da candidatura, é o projeto nacional de desenvolvimento. Esta, sim, é uma questão central. O eleitor e a eleitora terão duas grandes exigências. Uma será de natureza ética. A outra sobre a qualidade da proposta dos candidatos para fazer o País crescer com força e sustentabilidade. O projeto de desenvolvimento nacional que o partido está elaborando será a base da negociação para construirmos as alianças. O Brasil tem uma história política de personalismos. Precisamos de menos personalismo e mais propostas, programas e fidelidade a eles.

Por que o senhor e não Serra?

Não é uma questão de mérito ou demérito, de quem é melhor ou pior. É uma decisão política. Eu me sinto preparado. Cumpri todas as etapas. A experiência acumulada é grande. Doze anos no governo de São Paulo, seis deles como co-piloto de um grande estadista que foi o Mário Covas. Seis anos como governador. Completei uma missão. São Paulo é um exemplo para o Brasil de que é possível melhorar a qualidade do gasto público.

Mesmo não havendo dúvidas sobre suas qualificações, por que o senhor quer ser presidente?

Para reduzir a pobreza. Ninguém pode se conformar com o Brasil que cresce 2%, 3% ao ano. Não podemos ser condenados a campeão mundial dos juros e da carga tributária, a ter um câmbio tão desfavorável, uma economia que cresce à metade da taxa dos emergentes. O nosso tempo é o tempo da mudança, da velocidade da mudança. Ninguém vai esperar o Brasil. A iniciativa privada tem o sentido da urgência. Se ela não se adapta e não tem o benefício das reformas que a tornam competitiva, sai do mercado. O setor público empurra com a barriga. Precisamos tomar uma decisão séria de enfrentar as reformas. Não quero ser presidente para ser mais um. Quero chacoalhar as estruturas, mudar profundamente a política monetária, a política cambial, a política fiscal e defender inserção internacional mais profunda, com base na reciprocidade. Vou trabalhar, sem preconceito, para fazer o maior número possível de acordos comerciais, inclusive o da Alca (Área de Livre Comércio das Américas).

Se não for escolhido para disputar o Planalto, será candidato a outro posto?

Não vou analisar essa hipótese agora porque estou trabalhando para ser o candidato à Presidência. Mas quero deixar claro que trabalho pelo entendimento. Candidatura a cargo majoritário não é decisão pessoal. É decisão coletiva. Agora, deixo claríssimo: coloco meu nome à disposição do meu partido, quero ser e vou trabalhar para ser o candidato do PSDB à Presidência da República.

Até agora o senhor não fez nenhuma crítica a Lula.

Porque eu não acredito que alguém possa se eleger falando mal do adversário e até para não fazer propaganda dele. O povo já sabe de todos os desvios éticos e da corrupção.

As eleições já aconteceram e o senhor foi eleito. Quais as duas reformas prioritárias que proporá?

Em 1º de janeiro de 2007 mandarei ao Congresso os projetos da reforma tributária e o da reforma política, com prioridade para a fidelidade partidária.

As eleições já aconteceram, o senhor não foi candidato, seu partido perdeu e atribui à sua insistência em ser candidato uma das causas da derrota.

Não entendo que esteja havendo nenhuma saída tardia. Nós vamos sair antecipados e não atrasados porque a campanha só começa em julho.

O senhor teme ser responsabilizado por uma derrota do PSDB?

Acredito na vitória do PSDB. Nenhuma eleição é fácil. Não há nada mais passageiro do que pesquisa eleitoral, especialmente as que são feitas antes da hora. Hoje não há intenção real de voto, pois não se sabe nem quem são os candidatos. O que há são níveis de conhecimento das candidaturas possíveis. Eu confio no povo.