Título: Kirchner obtém maior controle da Justiça
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/02/2006, Internacional, p. A16

O presidente Néstor Kirchner aumentou de forma significativa seu poder sobre a Justiça, ao conseguir que a Câmara de Deputados aprovasse ontem de madrugada a lei de reforma do Conselho da Magistratura.

Com esta reforma, ele terá um poder mais amplo para definir a designação dos novos juízes.

Apesar da oposição de 89 deputados e duas abstenções, a lei foi aprovada por 148 votos depois de dez horas de debates. Para aprovar a reforma, o presidente conseguiu o respaldo de setores peronistas que estavam com posições dissidentes, como os seguidores do expresidente Eduardo Duhalde, que - diante da falta de lideranças alternativas a Kirchner - começam a se aproximar do governo. O Conselho da Magistratura é o organismo que definirá as designações dos novos juízes a partir do dia 16 de novembro.

Os partidos da oposição, que tentaram impedir a aprovação da reforma do Conselho, argumentam que Kirchner está cada vez mais 'hegemônico'.

Kirchner, além de controlar a Justiça por meio do Conselho da Magistratura - e de ter a simpatia da maioria dos membros da Corte Suprema - domina o Senado, parte da Câmara de Deputados e tem a obediência total de 21 dos 24 governadores (até mesmo dos governadores que formalmente pertencem aos partidos da oposição). O Conselho, que terá seu número de integrantes reduzido de 20 para 13 com a reforma, é composto por 3 juízes, 3 senadores e 3 deputados. Nestes últimos dois casos, dois parlamentares serão definidos pela maioria, enquanto que o parlamentar restante (senador ou deputado) será escolhido pela minoria.

Além deles, o Conselho será integrado por três advogados escolhidos pelo voto direto dos advogados registrados em todo o país, além de um representante da área acadêmica e um representante do Poder Executivo. Desta forma, Kirchner contará com cinco conselheiros vinculados ao governo para bloquear eventuais decisões do Conselho que precisem de dois terços dos votos, tal como promover ou abrir um processo contra um juiz.

A oposição argumenta que Kirchner está repetindo em escala nacional o controle sobre a Justiça que ele exerce em sua província natal, Santa Cruz, na Patagônia, que ele governou com mão de ferro durante quase uma década e meia.

O projeto foi elaborado pela senadora Cristina Fernández, mulher de Kirchner, e havia provocado uma forte resistência das organizações de advogados, partidos de oposição e grupos civis. Os críticos alegaram que a reforma encobre o objetivo do governo de controlar o poder judicial em função de propósitos políticos do presidente.

Os partidários do governo se defendem ressaltando as supostas falhas da instituição. Lembram que o Conselho da Magistratura, criado na reforma constitucional de 1994, tinha se tornado um organismo ineficiente, burocrático, muito custoso e pouco apto a garantir uma melhor administração da Justiça argentina.