Título: O peso da máquina
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2006, Nacional, p. A6

Caciques do PMDB se unem e jogam toda força na derrota de Garotinho

Dora Kramer

Ainda que por menos de dois meses, Anthony Garotinho conseguiu o impossível no PMDB: uniu as alas governista e oposicionista do partido. Ambas trabalham contra sua indicação como candidato a presidente da República, a ser decidida em 19 de março, numa disputa com o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto.

Mas, fiéis à tradição pemedebistas, os dois grupos continuam divididos no essencial e cada um defende Rigotto por um motivo diferente. A oposição a Lula, para levar a candidatura própria até o fim e impedir o partido de apoiar formalmente o governo, emprestando ao PT seu tempo de televisão. Os representantes da situação, para ganhar tempo no pressuposto de que lá na frente Rigotto possa ser mais facilmente removido do que seria Garotinho.

A contar pela robustez do ato de apoio ao governador gaúcho comandando por Orestes Quércia em São Paulo ontem, e se a disposição para a briga manifestada pelos presentes render desdobramentos eleitorais positivos, nem Garotinho nem Lula têm grandes chances de conseguir seus intentos: respectivamente, conseguir a legenda para concorrer e obter a chancela oficial do PMDB para disputar a reeleição em aliança.

Quércia, comandante absoluto da máquina do partido em São Paulo, joga na mesa a condição de primeiro colocado nas pesquisas de opinião para a disputa do governo paulista. Diz que não se candidata se Garotinho for o escolhido para a Presidência.

"Não gostaria de ligar meu nome ao dele", fulmina.

Na verdade, o problema não é tanto de nome a zelar, mas uma questão tática.

Com essa ameaça, o ex-governador quer levar os pemedebistas partidários de Garotinho em São Paulo a pensar duas vezes sobre o prejuízo do descarte de uma candidatura líder nas pesquisas no maior Estado e primeiro colégio eleitoral do País.

Nacionalmente falando, o alerta também tem seus efeitos, pois é inequívoca para o partido a importância da reconquista do poder num reino que dominou outrora e hoje está nas mãos do PT e do PSDB. Uma parte dele pode ir para o PFL já a partir de abril. Seja o prefeito José Serra ou o governador Geraldo Alckmin o candidato dos tucanos à Presidência, ambos têm vices do PFL, que assumirá o governo ou a Prefeitura.

Aí reside uma parte do peso de Orestes Quércia na articulação contra Garotinho, cujos participantes obviamente repetem a todo instante o propósito de apoiá-lo caso venha a ser o escolhido. Correndo o risco de prestar indevida homenagem à grosseria, trata-se de conversa fiada.

Os sinais de que se ele ganhar a indicação a situação será de salve-se quem puder são muito claros. Fala-se mal dele a bandeiras despregadas. Só se reconhece no ex-governador do Rio de Janeiro o mérito de ter conseguido "segurar" a realização de prévias, e com elas a tese da candidatura própria, e nada mais.

Sequer é acrescentado ao reconhecimento o fato de que, para os planos da oposição pemedebista, Garotinho foi absolutamente essencial.

Atribuem-se seus bons índices nas pesquisas ao fato de ser conhecido por ter governado o Rio e disputado a Presidência em 2002, aponta-se com menosprezo sua condição de cristão-novo no partido e suas idéias para a política econômica de mudança radical são tidas como inexeqüíveis. "Nem o índio da Bolívia defende isso", diz Quércia, referindo-se ao presidente Evo Morales.

Mas, se Garotinho excede, a caciquia do PMDB acha que Germano Rigotto padece do mal oposto. "É preciso imprimir um pouco mais de agressividade ao discurso dele", diz Orestes Quércia, enquanto relata as aflições do governador Roberto Requião, do Paraná, com o que identifica como cacoete tucano na conduta e na fala de Rigotto, principalmente quando se trata de política econômica.

Ontem Requião não foi ao ato em São Paulo, mas mandou representante e aguarda as benfeitorias radicais que já estão sendo providenciadas, embora não ao ponto de satisfazer totalmente o governador do Paraná.

Na largada, Rigotto conta com os governadores Jarbas Vasconcelos, de Pernambuco, e Luiz Henrique, de Santa Catarina. Neste fim de semana negociaria a adesão do governador do Tocantins e os outros - à exceção óbvia de Rosângela Matheus, do Rio - poderá conseguir, ou não, se seu nome deslanchar.

Nesta segunda-feira, Anthony Garotinho tem encontro marcado com Orestes Quércia, muito provavelmente para conversar a respeito de um pacto de não-agressão.