Título: PF desmonta rede de contrabando em embaixadas
Autor: Vannildo Mendes
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2006, Economia & Negócios, p. B8

A Receita e a Polícia Federal desmantelaram ontem, com a Operação Safári, a maior quadrilha de contrabando de uísque, perfumes e produtos finos importados, vendidos a políticos, executivos e autoridades de Brasília. Na lista de clientes estão empresários dos ramos de festas e eventos e um número expressivo de parlamentares, assessores e altos funcionários do Congresso. Todos serão investigados por receptação numa segunda etapa do inquérito.

Ontem, foram presas seis pessoas em flagrante, entre elas um alto funcionário do Ministério das Relações Exteriores e apreendidas dezenas de caixas de uísque, mais de 300 frascos de perfume francês, bolsas de grife européia, óculos escuros e outros produtos importados. A quadrilha era monitorada há quase um ano e teria movimentado mais de R$ 3 milhões nos últimos três anos.

A quadrilha é comandada pelo contrabandista Alzair Oliveira de Aquino, um dos presos, e integrada por pelo menos 28 pessoas, entre elas embaixadores e funcionários diplomáticos, que não puderam ser presos porque gozam de imunidade internacional. Os nomes deles, mantidos em sigilo, serão enviados pelo Itamaraty aos respectivos governos, para que respondam a processo criminal em seus países, segundo explicou o delegado Paulo Moreira, da PF, que chefiou a operação.

Para comprar os produtos livres de impostos e revendê-los com 300% ou mais de lucro, o grupo contava com a conivência do servidor Hamilton Ferreira dos Reis, chefe da Coordenação Geral de Privilégios e Imunidades do Itamaraty. Cabia a ele carimbar as autorizações de compras solicitadas pelas embaixadas apanhadas na fraude: Angola, Gabão, Congo, Senegal, Síria e Iraque.

Uísque comprado a US$ 8 ou US$ 9 (sem impostos) era revendido a R$ 50 ou R$ 60. Perfumes e produtos de grife davam lucro maior. Num período de dez meses de monitoramento feito pela PF e a Receita, o volume da fraude nas seis embaixadas foi de mais de US$ 500 mil.

A quadrilha contava também com a colaboração de funcionários da empresa Brasif, rede de lojas que vende produtos livres de impostos aduaneiros nos aeroportos. Só a embaixada de Angola importou 9 mil litros de uísque no período, o que dá uma média de 900 litros por mês. A embaixada dos Estados Unidos, que tem o maior corpo diplomático em Brasília, consome em média de 80 a 90 litros de uísque por mês.

Foram também presos na Operação Safári dois empregados da Brasif (Jonas Damião e Manoel de Aguiar), além dos contrabandistas Zuhair Murdashi e Angela Cristina Rodrigues, encarregados de distribuir as mercadorias. A PF não encontrou indícios de envolvimento dos donos ou dirigentes da Brasif, que distribuiu nota informando aguardar o final das investigações para "adotar todas as medidas legais e administrativas cabíveis".

O Ministério das Relações Exteriores informou prestar todo o apoio às investigações da Operação Safári. Até agora não há provas de envolvimento de diplomatas brasileiros. As embaixadas de Angola e da Síria esperam a acusação formal dos funcionários para se pronunciar. As demais não retornaram as tentativas de contato.