Título: Secretário teme efeito inverso
Autor: Paulo Moreira Leite
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2006, Nacional, p. A8

Ações podem ser vistas como promoção do racismo

O deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) diz que o governo pode até obter ganhos eleitorais com suas medidas dirigidas à população negra, mas acha isso natural. "Há muito tempo o partido defende essas medidas. Não é coisa do ano eleitoral."

Douglas Martins, secretário-adjunto de Igualdade Racial diz que "o efeito pode ser o contrário", pois para muitos setores "as ações afirmativas podem ser vistas como promoção do racismo".

Os argumentos são bonitos, mas é razoável imaginar que a distribuição de benefícios gratuitos para a população carente terá uma generosa contrapartida em votos, numa velha tradição da política brasileira.

O apoio à política de cotas envolve medidas de outra natureza - até porque não se destina às fatias miseráveis da população. Os especialistas concordam em que, com o ingresso de estudantes menos preparados, o nível do ensino nas universidades só poderá cair - pois aquilo que se consegue ensinar numa sala de aula é resultado direto da capacidade de aprendizado dos alunos.

Uma queda no padrão das universidades públicas acabará abrindo terreno para instituições privadas, como já ocorreu no ensino básico e médio, três décadas atrás. Como resultado, o País terá um ensino público pior e o ensino de qualidade, mais elitista. O desagradável é que o governo pode até recolher o bônus eleitoral dessa medida. Já o ônus educacional será pago pelas futuras gerações. "Só a vontade de ganhar votos com esse projeto explica a pressa da bancada do governo em avançar esse projeto", afirma o deputado Rodrigo Maia (PFL-RJ). "Um governo que só tem R$ 50 milhões para dar para creches por ano deveria preocupar-se acima de tudo com o ensino básico", diz ele.

Um levantamento do Ibope demonstra que a população desconfia desse projeto. Patrocinada por uma entidade de escolas privadas adversária das cotas, com base em 1.001 entrevistas distribuídas nas principais capitais do País, a pesquisa informa que 61% condenam a criação de cotas raciais na universidade. Essa rejeição, para alunos de escola pública, é assumida por 44%.