Título: 'Crise política inibe o crescimento'
Autor: Nilson Brandão Junior
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/02/2006, Economia & Negócios, p. B4

Avaliação é da indústria, em sondagem da FGV, que aponta ainda juros e impostos como os maiores entraves

A crise política já é apontada pelos industriais como um dos três principais fatores de limitação do crescimento econômico sustentado. No ano passado, o ambiente político dividia a última colocação entre os sete fatores citados, ao lado do desequilíbrio das contas públicas e da falta de política industrial, conforme pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV). O levantamento mostra, ainda, que os industriais prevêem aumento de 8% na capacidade de produção este ano e de 17% até 2008.

Os dados da Sondagem Industrial-Quesitos Especiais, divulgada ontem, mostram que o ambiente político foi apontado por 7% das 1.003 indústrias entrevistadas como problema para o crescimento. No início de 2004, antes da crise, esse fator era citado por apenas 2%.

A carga tributária ainda lidera a lista de problemas, lembrada por 43%, seguida pelos juros (33%) - bem mais que os 19% do ano anterior.

Segundo o coordenador da pesquisa da FGV, Aloisio Campelo, as respostas dos empresários foram influenciadas pelo aprofundamento da crise. O setor que demonstrou maior preocupação foi o de bens de capital, onde 20% indicaram o quesito como entrave. Na categoria de material de construção, a incidência também foi alta: 12%. As citações quanto ao ambiente político no resultado geral superam as do item "infra-estrutura deficiente", que foi de 5%.

Dentre os segmentos que mais indicaram a política com o fator limitador figuram o mobiliário (33%), mecânica (19%), celulose e papel (19%) e minerais não metálicos (14%).

Campelo destaca que o resultado está mais ligado às noticias envolvendo partidos políticos e pagamento de propinas do que ao fato de 2006 ser um ano eleitoral. Ele ressalta, contudo, um aspecto favorável, do ponto de vista econômico: com a estabilidade e maior previsibilidade na economia, os empresários estão observando com mais clareza outros problemas e as respostas já não se concentram em apenas uma questão.

O coordenador explica que no início do ano passado 53% das empresas citaram a carga tributária como principal problema, peso que caiu 12 pontos porcentuais este ano. Campelo avalia que medidas adotadas pelo governo, como a MP do Bem e isenções tributárias, contribuíram para essa variação.

Já as referências aos juros altos avançaram em 14 pontos, depois de um ano em que a alta da taxa Selic marcou a política monetária do governo.

As preocupações também cresceram em relação a outros dois problemas: riscos de desequilíbrio das contas públicas (de 2% para 5%) e falta de política industrial (de 2% para 4%). "Eles (os empresários) têm uma percepção maior de como funciona a economia brasileira. Não há tanto uma questão de primeira ordem tão relevante como havia no ano passado. Já não há mais um inimigo número um", diz Campelo.

RECUPERAÇÃO

O coordenador do Grupo de Acompanhamento Conjuntural (GAC) do Ipea, Fábio Giambiagi, afirma que os dados da pesquisa "de alguma forma corroboram a intuição" de que a crise política havia afetado a atividade econômica. Para o economista, a instabilidade política foi um dos motivos da desaceleração industrial no segundo semestre. "Mas são coisas que captam o passado. Daqui para frente espera-se uma recuperação em 2006", avaliou.

A sondagem também revelou que as indústrias prevêem uma expansão da capacidade instalada de 8% este ano, pouco acima dos 7% estimados no início do ano passado. Campelo alerta, contudo, que a previsão para o ano passado não foi, na prática, concretizada.

Ele acredita que parte dos investimentos foram postergados em 2005, ano de crescimento econômico mais fraco. Depois de crescer 4,9% em 2004, as estimativas de mercado indicam que o Produto Interno Bruto (PIB) avançou somente 2,5% no ano passado.

As maiores estimativas de aumento de capacidade para 2006 foram dos segmentos de material elétrico e de comunicações (22%), farmacêutico (17%), mecânica 911%) e química (9%).

As previsões mostram, segundo Campelo, que há expectativa de uma "retomada gradual de crescimento", que deve se sustentar nos próximos três anos. Para o triênio de 2006 a 2008, as maiores projeções de expansão foram de produtos alimentares (25%) e material elétrico (36%), resultado que foi impulsionado pelo dinamismo da indústria de telefone celular.