Título: João Paulo chama relator de mentiroso, mas perde por 9 a 5
Autor: Denise Madueño
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/03/2006, Nacional, p. A11

O Conselho de Ética da Câmara aprovou ontem por 9 votos a 5 o pedido de cassação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) em uma reunião em que não faltaram ataques do petista ao relator do processo, deputado Cezar Schirmer (PMDB-RS), que concluiu pela perda de mandato do parlamentar. João Paulo, em sua defesa final, chamou o relator de mentiroso, omisso, covarde e preconceituoso, provocando um clima tenso na reunião. O petista acusou Schirmer de fazer um relatório com "ranço e agressividade", acusando-o também de ter "exagerado na tinta" ao pedir a sua cassação.

A maior parte da reunião do conselho, que durou cerca de 6 horas e meia, foi gasta com a defesa de João Paulo. A deputada Ângela Guadagnin (PT-SP), aliada do ex-presidente da Câmara, levou 2 horas e 48 minutos para defender o petista lendo um novo parecer a favor do deputado. O texto de Ângela e o tempo que ela levou para ler foram maiores do que o voto do próprio relator apresentado na terça-feira da semana passada.

Antes da leitura de Ângela, a defesa também gastou cerca de uma hora questionando a validade do uso, no parecer, de relatório preliminar do Tribunal de Contas da União (TCU), desfavorável ao petista. João Paulo não descarta a hipótese de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o parecer de Schirmer. "Vamos estudar todas as hipóteses", afirmou, após a decisão do conselho.

O longo texto de Ângela Guadagnin e os adjetivos usados por João Paulo contra o relator não sensibilizaram o colegiado. "O discurso agressivo mostra a falta de convicção na defesa", respondeu Schirmer. "Ele não contesta o saque nas contas de Valério", completou o relator, citando um dos três principais pontos que usou para sustentar o pedido de cassação.

Além do saque de R$ 50 mil feito pela mulher de João Paulo, Márcia Regina Cunha, na conta da SMPB Publicidade, de Valério, o relator diz que o petista ocultou informações importantes sobre o contrato da Câmara com a SMPB quando presidia a Casa e ao apresentar a versão de que Márcia teria ido ao Banco Rural resolver pendência de uma fatura de TV por assinatura. "O vitorioso foi Valério que, 15 dias antes do processo licitatório, ofereceu R$ 50 mil a João Paulo", afirmou Schirmer.

João Paulo, em tom agressivo, discursou afirmando que o relator traçou uma imagem dele que não é real. "Não sou este homem perigoso, omisso, corrupto que, maliciosamente, faz as tramas por trás do poder", defendeu-se, partindo para o ataque. "Vossa Excelência omite o que interessa a Vossa Excelência. Isto não é um ato de um homem corajoso. O deputado Cezar Schirmer mente", disse João Paulo, afirmando que o relator diz no parecer que o petista queria formar um núcleo de campanha para disputar o governo de São Paulo.

João Paulo buscou fatos históricos para criticar a pressão da opinião pública. "A moral já trouxe muito prejuízo. Jesus Cristo foi crucificado porque a opinião pública pediu. Hitler subiu ao poder porque a opinião pública pediu. A moral já levou Galileu Galilei à fogueira."

O relatório de defesa de Ângela Guadagnin também teve ataques ao relator. Ela afirmou que Schirmer distorceu depoimentos e os usou de forma parcial para afirmar que o petista tinha um relacionamento intenso com Valério, tido como um dos operadores do mensalão.

Segundo a deputada, se João Paulo soubesse da origem do dinheiro, jamais teria mandado a própria mulher buscá-lo.

A deputada reproduziu uma declaração do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares para dizer que o dinheiro foi colocado à disposição de João Paulo pelo PT. Além disso, afirmou que os R$ 50 mil foram utilizados em pesquisas de opinião em municípios paulistas. "Quer-se, a ferro e fogo, impor-se a pena capital ao deputado João Paulo Cunha. Ignora-se o seu passado de lutas." Ela procurou justificar a versão de João Paulo à CPI dos Correios, dizendo que o deputado não falou do saque por crer que o dinheiro era do PT.

Nada disso impediu a aprovação do relatório de Schirmer, que agora será apreciado pelo plenário da Câmara. Ainda não há data estabelecida pela presidência da Casa para essa votação, que pode cassar o mandato de João Paulo.