Título: Governo estuda medidas para tentar acabar com overbooking
Autor: Mariana Barbosa e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/03/2006, Economia & Negócios, p. B16

O presidente da Infraero, Carlos Wilson, afirmou ontem que o governo estuda uma forma de acabar com a prática de overbooking. Comumente utilizada pelas empresas aéreas, a prática consiste em aceitar um número de passageiros maior do que a capacidade dos aviões para evitar que as desistências de última hora - o chamado no-show - gerem ociosidade nos vôos. Apesar de admitir a adoção de multas para as empresas, Carlos Wilson disse que "o melhor caminho é o entendimento". "Não é possível ter 20 ou 30 passageiros a mais em todo vôo."

Segundo Wilson, o estudo para acabar com o overbooking foi determinado pelo vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar. A medida é conseqüência da repercussão do episódio do general Francisco Albuquerque, vítima de overbooking em um vôo da TAM na Quarta-feira de Cinzas. Diferentemente dos 14 passageiros que também foram vítimas de overbooking, Albuquerque conseguiu embarcar depois de uma determinação para que a decolagem fosse interrompida. "Está se dando uma dimensão ao caso como se isso só tivesse acontecido com o general Albuquerque. Só que isso acontece todos os dias, com muitos cidadãos, e se tornou uma prática abusiva contra o passageiro", disse Carlos Wilson.

As companhias aéreas rebatem as declarações e alegam que a ocorrência de overbooking não é tão comum. "O overbooking só acontece por causa do no-show. E a proporção de passageiros com reserva que não comparecem é desproporcional aos casos de bilhetes vendidos em excesso", diz o presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea), George Ermakoff. Segundo o Snea, as empresas fazem reservas a mais pois têm estatísticas que mostram que, em média, de 10% a 20% dos passageiros faltam aos vôos. "No ônibus, quem não aparece perde a passagem. No avião, não."

De acordo com o Departamento de Aviação Civil (DAC), a TAM, líder do setor, é a recordista de reclamações de passageiros para casos de overbooking. Em julho do ano passado, por exemplo, 0,95% dos passageiros transportados pela companhia (ou cerca de 15 mil) reclamaram da prática ao DAC, ante 0,36% na Varig (cerca de 3,1 mil). Apesar de a Gol não praticar overbooking, as estatísticas do DAC mostram 0,1% (cerca de 900) de reclamação contra a empresa em julho.

Na avaliação do presidente da Associação Nacional em Defesa dos Direitos do Passageiro de Transporte Aéreo (Andep), Cláudio Candiota, o overbooking fere os direitos do consumidor. "Se eu compro, o lugar tem de estar lá para mim." Cada tarifa de bilhete aéreo tem uma regra específica para casos de não comparecimento. Nas tarifas mais caras, o passageiro não costuma pagar nada por não comparecer ao vôo. Já nas promocionais, para poder utilizar o bilhete em outro vôo, o passageiro paga uma multa.

A Gol é a única empresa no Brasil que não pratica overbooking. Diferentemente da TAM e da Varig, a Gol não tem um sistema de reservas. "Uma vez vendido o bilhete, o sistema tira aquele assento do ar", diz o vice-presidente de Marketing da Gol, Tarcísio Gargioni. "Quem compra tem 100% de certeza que o assento estará disponível." Quem não comparece paga uma multa de R$ 40.

Um estudo recém-publicado pelo núcleo de estudos do transporte aéreo (Nectar) do Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA) sobre overbooking no Brasil mostra que não existe abuso de má-fé por parte das empresas, mas que há margem para aprimorar as previsões de demanda e de no-show.

Além disso, falta transparência na política de ressarcimento. "Aqui, você tem que lutar para ser indenizado, enquanto nos EUA tem até gente que gosta de ficar de fora do avião por causa das passagens, hotéis e outras recompensas", diz a pesquisadora do Nectar e uma das autoras do estudo, Renée Ferraz.

MUDANÇA

O novo presidente da Infraero será o brigadeiro da reserva José Carlos Pereira, atual diretor de Operações da estatal. Carlos Wilson deixa o cargo no final deste mês para concorrer a uma vaga de deputado federal por Pernambuco.