Título: Quem paga o rombo?
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Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2006, Notas e Informações, p. A3

O presidente do fundo de pensão da Petrobrás (Petros), Wagner Pinheiro, anunciou que a estatal apresentará aos seus empregados proposta de cobertura do déficit atuarial da entidade em 2004, no valor de R$ 5,3 bilhões. Ele admitiu que o que está em discussão é "se haverá apoio integral da empresa" ou não - isto é, se a Petrobrás entrará com a totalidade dos recursos necessários para tapar o buraco, como sempre ocorreu na história da companhia.

O fundo Petros se destina a complementar a aposentadoria de mais de 40 mil trabalhadores na ativa e de 53 mil aposentados. É o segundo maior do País, com investimentos de R$ 28,1 bilhões, conforme os dados de novembro publicados na revista da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), abaixo apenas do Previ, dos funcionários do Banco do Brasil.

Mas, certamente, o Petros é o líder inconteste nos "acertos" de contas relativos ao passado, pois o patrimônio é insuficiente para cobrir as responsabilidades futuras do fundo com seus participantes.

Por quatro vezes, nos últimos oito anos, foram constatados grandes rombos no Petros. A origem do problema remonta aos anos 70, quando a Petrobrás criou as vantagens da aposentadoria complementar para o pessoal, mas não entrou com os recursos para financiá-la nem exigiu a contrapartida necessária dos funcionários. Por mais de 20 anos o déficit ficou escondido. E foi agravado na década passada, na gestão Joel Rennó, que incluiu, entre os participantes do fundo, funcionários que não haviam feito contribuições ou haviam sido contratados há pouco tempo, mas receberiam as mesmas vantagens dos que aderiram ao fundo desde sua criação.

O primeiro rombo, da ordem de R$ 5,5 bilhões, foi constatado em 1995 e confirmado em 1999 pelo então presidente do Petros, Carlos Flory, que também propôs uma solução: a modificação dos planos de benefícios. O regime de benefício definido, em que o empregado sabe quanto irá receber ao se aposentar, sem ter de se preocupar com o que está sendo depositado hoje, seria substituído pelo regime de contribuição definida, em que a aposentadoria depende do montante acumulado nas contas individuais de cada empregado, como ocorre na maioria dos fundos de pensão patrocinados por empresas privadas. Mas a solução foi torpedeada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) e derrotada na Justiça.

A situação se agravou no atual governo, quando aumentou a participação, no conselho do fundo Petros, de opositores declarados do regime de contribuição definida. Em 12 de fevereiro de 2005, a Petrobrás publicou fato relevante em que admitia que o fundo tinha um déficit atuarial de R$ 8,3 bilhões, além de um déficit com planos de saúde de R$ 5 bilhões.

Esses números cresceram em 2005. O balanço anual mostrou que, em dezembro, o custo presente dos compromissos com a aposentadoria do pessoal, inclusive de empresas coligadas, atingia R$ 33,7 bilhões, contra ativos no "valor justo" de R$ 24,4 bilhões. Faltavam, pois, R$ 9,3 bilhões, mas a empresa não reconhecia R$ 6,9 bilhões - ou seja, a contabilidade não é clara. E os planos de assistência médica, totalmente bancados pela companhia, apresentavam em 2005 um desequilíbrio de R$ 11,6 bilhões.

O déficit que a empresa quer agora eliminar representa, portanto, apenas parte do problema. Em fevereiro de 2005, quando foi revelada a existência do déficit de 2004, Wagner Pinheiro previu que a Petrobrás assumiria o encargo. "A Petrobrás quer pôr fim nos déficits sucessivos", declarou. O que só seria possível se todos os funcionários tivessem se transferido para o novo plano de contribuição definida, que, na verdade, devido à derrota na Justiça, só abriga quem entrou na empresa a partir de 2002.

É mais do que tempo de a estatal dividir os ônus do fundo de pensão com os beneficiários dos planos de aposentadoria, como faz qualquer empresa. A Petrobrás é uma companhia aberta, com centenas de milhares de acionistas. Não pode fazer o que bem entende com o dinheiro de 185 milhões de brasileiros.