Título: Na reta final, CPI dos Correios vive divisão e clima de guerra interna
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2006, Nacional, p. A6

Às vésperas da apresentação de seu relatório final, prevista para amanhã, a CPI dos Correios vive clima de guerra interna. O Planalto e seus aliados pressionam para suavizar o texto e salvar do pedido de indiciamento estrelas petistas como José Dirceu, Luiz Gushiken e José Genoino.

Os oposicionistas fazem pressão no sentido inverso, para manter o tom adotado ao longo dos dez meses de investigação. Eles temem que o relator Osmar Serraglio (PMDB-PR) esteja disposto a fazer um texto "light". E ainda acusam petistas de aliciar os funcionários da comissão para fazer um texto alternativo ao do relator.

Para deixar a temperatura interna ainda mais elevada, os integrantes da cúpula da CPI acreditam que a votação do relatório de Serraglio deve ser apertada. Ninguém arrisca adiantar qual será o resultado.

A divisão da CPI aparece na cúpula. O presidente da comissão, senador Delcídio Amaral (PT-MS), tenta convencer Serraglio a elaborar um texto enxuto e sem adjetivos fortes. Segue assim a linha do Palácio do Planalto, cuja ordem é "desidratar" ao máximo o relatório, retirando a contextualização do mensalão e poupando do pedido de indiciamento os ex-ministros Luiz Gushiken e José Dirceu, por exemplo.

"Precisamos apresentar um relatório isento, justo, equilibrado, fático, técnico, sem adjetivação e encaminhá-lo a quem de direito, ao Ministério Público, à Polícia Federal e, eventualmente, às Mesas da Câmara e do Senado", diz Delcídio.

A reação foi imediata. "O PFL não vai aceitar que qualquer tipo de pressão prejudique a contundência que deve ser a marca do relatório final", avisa o sub-relator de fundos de pensão, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA).

A estratégia dos governistas é salvar do pedido de indiciamento pessoas sobre as quais não haja provas contundentes. "Vamos sugerir indiciar apenas as pessoas que têm culpabilidade comprovada", diz o vice-presidente da CPI, deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA). "Quando houver dúvidas e as investigações não chegarem a uma conclusão, vamos encaminhar o nome do envolvido para o Ministério Público continuar as apurações", explica Bentes.

Ou seja, envolvidos no mensalão serão poupados do pedido de indiciamento com a divisão das punições em três categorias: os indiciados, as pessoas próximas do indiciamento e outro grupo que merece investigação maior para ser indiciado.

Por essa nova metodologia, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-secretário-geral do partido Silvio Pereira, que confessou ter ganho um carro da construtora GDK, estariam livres do pedido de indiciamento. Já o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, que assumiu a culpa pelo esquema de caixa 2, terá seu indiciamento pedido provavelmente por tráfico de influência e corrupção ativa.

DANÇA

Na avaliação de integrantes da CPI dos Correios, a suavização do relatório final é essencial para que a proposta seja aprovada. O temor é que a comissão acabe sem aprovar um texto final, com a conotação de que a investigação terminou em pizza. "Os culpados estão apostando na não-aprovação do relatório, porque isso criaria as condições necessárias para que, depois, eles se livrassem das penas no Judiciário", diz Delcídio.

"Resta saber se vão ficar na dança solo da deputada Ângela Guadagnin ou se vão querer fazer um corpo de baile", observa o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ), relator-adjunto da CPI.

Parlamentares oposicionistas acusam o governo de ter aliciado três funcionários do Banco Central, que foram designados para auxiliar na análise de documentos da CPI. Os funcionários seriam ligados ao PT e estariam produzindo um levantamento paralelo para subsidiar um relatório contrário ao oficial.

"É uma situação inaceitável. Essas pessoas têm de ser afastadas imediatamente", defendeu ontem Eduardo Paes. Os funcionários do BC estariam trabalhando em conjunto com o deputado Maurício Rands (PT-PE).

"Essa é a hora da fofoca. Não é verdade que estou trabalhando em conjunto com os técnicos do BC", disse Rands, que admitiu, no entanto, que o PT prepara um "relatório alternativo". "Não vamos aceitar coisas absurdas." O PT não quer, por exemplo, que o relatório conclua que o mensalão foi usado para que os deputados votassem a favor do governo. "O mensalão existiu no sentido de que houve pagamento, mas não existe essa condicionalidade com votações de matérias de interesse do governo", observou Rands.