Título: Pizza faz Câmara discutir fim de julgamentos
Autor: Denise Madueño
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2006, Nacional, p. A6

Diante das seguidas absolvições de deputados acusados no esquema do mensalão, a Câmara já discute mudanças no funcionamento do Conselho de Ética. Ganha apoio a cada dia a idéia de tirar da Câmara a tarefa de julgar os casos de falta de decoro, transferindo a atribuição para o Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, o conselho ficaria apenas com a tarefa de examinar a denúncia antes de enviá-la ao tribunal.

Nesta semana, o líder do PDT na Câmara, Miro Teixeira (RJ), vai entregar aos líderes partidários uma proposta de emenda à Constituição para mudar a regra, que - se aprovada - deverá valer só a partir do próximo mandato.

O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), afirma ser simpático à discussão e prefere não entrar no mérito do caso, mas aponta os riscos que a Câmara corre julgando deputados. "Ou é o corporativismo ou é o faccionismo", afirma Aldo.

Para ele, se a Casa absolve um integrante da instituição pode ser acusada de corporativista e se condena pode ser por decisão da facção majoritária. "Os riscos são muito visíveis", diz. Na proposta em elaboração por Miro, o Ministério Público também continua com a missão de processar parlamentares e enviar as ações ao STF. Da mesma forma procede a Câmara.

Caso o Supremo aceite a denúncia, o parlamentar é afastado do mandato, sem remuneração, para um julgamento que deverá seguir rito sumário. No caso de condenação por crime cuja pena inclua a reclusão, o parlamentar perderá o mandato automaticamente. No processo em que o parlamentar for absolvido, ele volta ao cargo e recebe os salários atrasados.

"Nós (parlamentares) não julgamos. Julgar é aplicar a Justiça. O que estamos vendo é a condenação ou absolvição de deputados a partir de simpatias ou antipatias, e isso não é republicano", afirma Miro. Na Inglaterra, lembra o deputado, o parlamentar não é cassado, mas pode ser preso e responder ao processo atrás das grades.

"Esse não é um tribunal isento", argumenta o líder do PTB, José Múcio Monteiro (PE), referindo-se ao plenário da Câmara. "Cada deputado já entra no plenário com os 'jurados' de seu partido a seu favor."

CONTRA

Na Câmara, há os que são contra mudar a forma de julgamento. Eles sustentam que seria dar muito poder ao Supremo. Além disso, questiona-se o fato de o STF ser um colegiado de só 11 ministros - que foram nomeados e não eleitos - para decidir sobre mandatos outorgados por milhares de votos.

O líder do PSDB, Jutahy Júnior (BA), contrário à mudança, argumenta que a avaliação da Câmara nos processos é política. "Nós somos representantes do povo", reafirma. "Aqui o componente não é jurídico, é decoro, é comportamental. Muitas vezes não está na ilicitude penal, mas em um comportamento moral incompatível com a função", avalia Jutahy.

O líder tucano usa ainda o processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor como exemplo. "A Justiça absolveu Collor por falta de provas. Nem por isso se duvida de que ele mereceu ser cassado por falta de decoro", afirma.

O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), do Conselho de Ética, defende que se estabeleçam gradações de penas para evitar que se acabe "no tudo ou nada", ou seja, cassação ou absolvição. "Cassação e proibição de se eleger por oito anos é muito drástico", considera.