Título: Bolsky escapou da II Guerra, não da miséria
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Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2006, Internacional, p. A9

Josef Bolsky achou que já tinha passado por tudo. O sobrevivente do Holocausto de 79 anos nunca imaginou que voltaria e passar necessidade. Mas foi o que aconteceu ao judeu polonês que imigrou para Israel pesando 36 quilos depois da Segunda Guerra Mundial, na esperança de uma vida melhor.

Depois de anos trabalhando numa fábrica de pneus na cidade de Netânia, no norte de Israel, Bolsky perdeu o emprego e, com ele, todas as suas economias. Hoje, depende da caridade dos outros para comer.

Como Bolsky, um em cada quatro idosos vive abaixo da linha da pobreza em Israel. Ele é uma das 500 pessoas que, diariamente, fazem fila em frente ao sopão do chefe de cozinha Yaakov Pinto, em Netânia.

Pinto está ligado à maior rede de assistência social do país, a Meir Panim. Pelo equivalente a US$ 3, a instituição de caridade serve comida para quem foi esquecido pelo governo e deixado para trás pela sociedade.

"Se não fosse pelo sopão, eu estaria seco. Procuraria migalhas nas lata de lixo", desabafa Bolsky.

Entre uma colherada e outra, a imigrante russa Ada Shitz, de 72 anos, que mora há 13 em Israel, reclama da diminuta aposentadoria que recebe do governo. Ada ganha cerca de US$ 350 por mês, o que a coloca abaixo da linha de pobreza. Se, para níveis brasileiros, o valor parece alto, em Israel não compra uma cesta básica, além de corresponder a apenas metade do salário mínimo local.

"Com isso mal pago o aluguel. Tem mês que tenho que escolher entre comprar pão ou remédios. É um absurdo", reclama Ada. Entre os imigrantes, principalmente os da ex-União Soviética e os da Etiópia, o percentual de pobres é de quase 20%.

Idosos e imigrantes são dois dos setores da população mais afetados pela pobreza. Mas há estratos ainda mais atingidos.

Os dois principais são os religiosos ortodoxos, que costumam ter famílias numerosas, e as minorias árabes, que têm dificuldades em entrar no mercado de trabalho. Das famílias com mais de quatro filhos, 54,7% são pobres. No caso dos árabes, quase 50% vivem abaixo da linha de pobreza.

Mães solteiras também penam na realidade de Israel. Uma em cada três sustenta sua família com menos dinheiro do que o mínimo necessário. "Não vejo luz no fim do túnel. Do jeito que as coisas vão, vou ter que abrir mais uma sucursal", lamenta o chefe Yaakov Pinto, o cozinheiro do sopão de Netânia.