Título: 'Juro não fez banco lucrar mais'
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/03/2006, Economia & Negócios, p. B5

Henrique Meirelles dissocia juro alto dos lucros recordes que os bancos vêm tendo

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, se exime de qualquer responsabilidade pelos lucros recordes dos bancos em 2005 e diz que as altas taxas de juros no Brasil não são necessariamente a causa desse resultado. Na semana passada, o próprio BC divulgou estudo mostrando que os bancos lucraram 36% mais ante 2004, superando R$ 28 bilhões. Meirelles aponta ainda que o período de exuberância do mercado internacional para papéis dos países emergentes pode estar acabando, o que justifica a política prudente que o Brasil tem adotado.

Os resultados recordes dos bancos geraram na semana passada comentários até de dom Odilio Sherer, secretário-geral da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), de que o presidente Lula transformou o País em paraíso financeiro. Meirelles, ainda que se recuse a responder aos comentários do bispo, argumenta que todos os setores cresceram no Brasil em 2005. "Não me cabe julgar ideologicamente os setores empresariais", diz. Meirelles está na Basiléia, Suíça, para reuniões no Banco de Compensações Internacionais (BIS).

"Compete aos bancos falar sobre isso. O BC é apenas um regulador e implementador de política monetária", afirma Meirelles. Ele descarta que a taxa de juros, uma das mais altas do mundo, seja "necessariamente o que determina o lucro dos bancos." No BC, a tese mais aceita é a de que os spreads (diferença de custos de captação dos bancos e quanto é cobrado para emprestar o dinheiro) e o volume de recursos é que teriam garantido os lucros recordes.

"É normal em uma economia que cresce que as empresas aumentem sua lucratividade. O importante é que os resultados das empresas em geral estão muito bons", diz. Meirelles lembra que as companhias cotadas em bolsa também têm apresentado resultados recordes. "Mostra o crescimento sustentável da economia." Ele só não explica por que o Brasil foi uma das economias que menos cresceu em 2005 entre os emergentes e teve resultado superior apenas ao do Haiti entre os países das Américas. Os juros "na ponta da linha" estão caindo e a competição entre bancos aumentou, acrescenta Meirelles.

O presidente do BC nega que o Comitê de Política Monetária (Copom) esteja dividido diante da votação na semana passada que levou à queda da taxa de juros em 0,75 ponto. Dos nove votos, três foram favoráveis a uma queda de 1 ponto. "Em várias oportunidades, o Copom não teve decisão unânime. É normal e já ocorreu antes."

LIQUIDEZ

Segundo Meirelles, há indicações de que a liquidez no mercado internacional, que foi aproveitada pelos mercados emergentes em 2005, pode sofrer mudanças este ano. O cenário internacional pode estar passando de um "ambiente extremamente benigno para um ambiente talvez de maior normalidade." O Japão, na semana passada, deu indicações que poderá elevar seus juros, o que mostra a tendência nos mercados. Para Meirelles, porém, essas mudanças devem ser graduais.

O BIS confirma a exuberância de 2005 diante da melhora na posição externa das economias emergentes e do apetite por risco por parte dos investidores. Diante desse cenário, os países emergentes aproveitaram para aumentar a emissão de bônus em mais de 50%, batendo todos os recordes.

Meirelles não acredita que essa mudança de cenário signifique o início de turbulências. "Não vejo indicação de que estejamos entrando em período de crise", afirma. "Mas isso confirma a nossa política no Brasil de reforço dos fundamentos, de recomposição de reservas, de diminuição de exposição cambial e outras medidas para preparar o País para uma situação que possa não ser tão favorável no contexto internacional."

Meirelles afirma que o País está preparado para eventuais volatilidades diante do processo eleitoral. "A economia está forte e saudável. Nos preparamos para enfrentar volatilidades externa e interna, como já passamos em 2005 com a crise política. Certamente estamos preparados para as eleições. A situação da economia é outra e vulnerabilidades externas foram superadas."