Título: Bois terão nova certificação para atender a exigências européias
Autor: Eduardo Magossi
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2006, Economia & Negócios, p. B16

Governo aprimora normas para garantir as exportações de carne brasileira

A necessidade de atender às exigências impostas pela União Européia para importação da carne bovina brasileira levou o governo federal a aprimorar os processos de rastreabilidade e de certificação existentes no País. O governo criou uma nova normativa, com regras e procedimentos que devem mudar o cenário das empresas certificadoras brasileiras, um setor que gira cerca de R$ 20 milhões por ano.

A maior preocupação das certificadoras é de que a nova normativa não tem data para ser aprovada, o que deixa as empresas cautelosas quanto ao futuro. Uma reunião entre certificadoras e o comitê técnico consultivo do Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina estava marcada para hoje, mas foi adiada, sem data certa para ocorrer, segundo informações do Ministério da Agricultura.

A única certeza das certificadoras é de que a nova normativa irá mais que dobrar o custo da rastreabilidade para o pecuarista, informa o presidente da Associação das Empresas de Rastreabilidade e Certificação Agropecuária (Acerta) e diretor da certificadora Planejar, Luciano Médici Antunes.

Segundo ele, a nova normativa tem muitos pontos positivos, mas apresenta muitas lacunas que o governo não está discutindo. Hoje, as certificadoras são responsáveis pela rastreabilidade do boi e também pela certificação. Por rastreabilidade entende-se o acompanhamento do animal desde seu nascimento até o abate, com registro de doenças, de trânsito entre fazendas ou entre fazenda e frigorífico, e a formação de um banco de dados. A certificação é o processo de ir a campo verificar se os dados da rastreabilidade estão corretos e se os animais estão propriamente identificados.

Pela nova normativa, todo o processo de rastreabilidade passa a ser executado não mais pelas certificadoras, mas pelos órgãos estaduais ligados ao sistema de defesa sanitária governamental. "As certificadoras vão ficar apenas com o papel de realizar auditorias nas fazendas duas vezes por ano. Todo o investimento realizado nos últimos anos na formação de banco de dados, no treinamento de técnicos, será perdido", diz Antunes.

Para realizar as auditorias de acordo com a nova normativa, o perfil das certificadoras irá mudar e novos investimentos em treinamento terão de ser realizados. "O custo vai aumentar para o pecuarista, porque o trabalho que antes era feito por apenas uma empresa agora será feito por duas", diz.

Uma preocupação do setor é se os órgãos estaduais de defesa sanitária estão preparados para realizar estas novas funções. Antunes explica que estes órgãos não estão totalmente preparados nem equipados para realizar a rastreabilidade. "A normativa também não esclarece de onde virão os recursos para equipar estes órgãos e nem como será feita esta transição, com a passagem das funções das certificadoras para o governo", diz.

MODELO

O diretor substituto do grupo de defesa sanitária animal da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, Cláudio Alvarenga de Mello, explica que o sistema utilizado para fazer a rastreabilidade deverá ser o que hoje é usado para emitir as Guias de Trânsito Animal, documento onde são registradas todas as movimentações de animais com identificação de origem e destino.

Porém, estas guias são feitas para lotes, e não traz a identificação individual do boi, o que é necessário na rastreabilidade. "Teremos de nos adaptar ao novo cenário, mas realmente ainda não existe uma definição de onde virão os recursos para se elaborar toda uma estrutura de trabalho eficiente. Em um primeiro momento, temos condições de fazer a rastreabilidade de animais voltados para o mercado internacional, mas um volume maior de animais fica impossível", diz.

A normativa traz também alguns pontos positivos para o mercado. Segundo José Amaral Wagner Neto, diretor da certificadora OIA Brasil, a normativa vai padronizar procedimentos que antes eram muito diferenciados. "A legislação atual permite que cada certificadora realize suas auditorias de uma forma própria, o que cria lacunas no processo. A nova normativa prevê a regulamentação de procedimentos homogêneos para se avaliar a propriedade, e as questões sanitárias, nutricionais, e de bem estar do animal."

Entretanto, as novas regras ainda não definiram como será a identificação individual do animal, já que o documento existente anteriormente, conhecido como DIA, foi extinto. Também preocupa o fato de que cada propriedade poderá fazer a certificação com apenas uma certificadora. "Atualmente, uma propriedade pode utilizar os serviços de duas ou mais certificadoras", diz Antunes, da Acerta. Segundo ele, esta medida pode fazer com que o número de certificadoras existentes hoje, em torno de 65, diminua de forma expressiva.