Título: Decepções e críticas ao Copom
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2006, Economia & Negócios, p. B2

Depois que o Comitê de Política Monetária(Copom) fixa a taxa Selic, há sempre uma decepção nos meios econômicos, mesmo que a decisão fique no nível previsto pelo mercado, mas não com a redução considerada ideal. Foi o que aconteceu anteontem, de novo, depois de as autoridades monetárias haverem fixado a Selic em 16,5%, com queda de apenas 0,75 ponto porcentual, quando, em razão dos indicadores econômicos, se havia sonhado com um corte de 1 ponto porcentual.

Não há dúvida de que o Copom continua mantendo uma posição muito ortodoxa, embora nesta última reunião três membros, dos nove, houvessem votado a favor de um corte maior. É possível que, depois da divulgação de um documento do PT - ainda não oficial - pedindo que o Banco Central (BC) adote uma visão desenvolvimentista na sua atuação, parte dos membros do Copom quisessem reafirmar sua independência. A divulgação da ata - que seguramente não fará referência a ser essa a causa da decisão da maioria - deverá esclarecer também se o BC ficou sensível à perturbação do clima do mercado internacional, que parece ter tido seu apogeu durante a reunião do Copom.

Parece-nos mais provável que os membros do comitê se orientaram pela necessidade de não abandonar uma política gradualista, levando em conta que, no passado, o Copom fixou a Selic alto demais.

Não há dúvida de que a taxa básica de 16,5%, que em valor real deve ser de, pelo menos, 11%, não favorece o crescimento econômico. Neste sentido, podemos entender as queixas do comércio e da indústria. Com uma taxa real desta ordem, é muito difícil realizar investimentos suscetíveis de aumentar a taxa de crescimento econômico. Paralelamente, o Copom não colabora com o Tesouro na redução do custo de financiamento da dívida federal.

A reação à decisão do Copom apresenta, para nós, dois fatos anormais. Seria de esperar que as entidades de classe protestassem não só contra as autoridades monetárias, mas também contra as instituições financeiras que, apesar de seis cortes consecutivos da Selic, mantêm um spread elevado e lucros muito polpudos.

A segunda anormalidade é que não protestam contra o fato de que a atual política monetária se limita a fixar uma taxa básica elevadíssima, quando caberia ao Executivo implementar uma política de austeridade fiscal que possibilitasse não apenas melhorar a qualidade dos gastos públicos, como reduzir uma carga tributária que nos dá o título de campeão entre os países emergentes.

Sem um engajamento total das entidades de classe e não apenas da Associação Comercial, o Copom nunca deixará de ter pretextos para justificar a sua ortodoxia.