Título: Estatal de Dubai devolve portos
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2006, Internacional, p. A17

Empresa decide transferir controle de seis grandes portos americanos no Atlântico para companhia americana

Num ato de rebeldia contra o presidente George W. Bush sobre sua condução da política de segurança, que era até agora o ponto forte do governo, os líderes republicanos da Câmara submeterão a votação, na semana que vem, um projeto de lei que, se adotado, obrigará à nacionalização parcial das empresas que prestam serviços portuários nos EUA.

Incluída num legislação inadiável de suplementação de fundos para a guerra do Iraque e Afeganistão, a proposta foi aprovada por 62 votos a 2 na Comissão de Dotações Orçamentárias da Câmara. Ela obriga a DP World, empresa estatal de Dubai, a associar-se a uma companhia americana para ser autorizada a operar terminais em seis grandes portos americanos do Atlântico, um direito que adquiriu ao comprar a companhia inglesa P&O Ports North America, que detinha os contratos de operação de terminais nos portos de Nova York-Newark, Filadélfia, Baltimore, Miami e New Orleans.

A pressão deu certo. Ontem, horas depois de a DP World ter reafirmado seus planos para assumir os serviços nos terminais americanos, o senador republicana John Warner, da Virgínia, que preside a Comissão das Força Armadas, anunciou que a empresa de Dubai decidiu transferir totalmente "a uma entidade americana" o controle dos terminais cujos direitos adquiriu. A iniciativa republicana é apenas uma entre 19 projetos de lei de cunho nacionalista e protecionista apresentados nas duas últimas semanas por senadores e deputados dos dois partidos. Isso depois que uma comissão federal que monitora a aquisição de empresas ou serviços nos EUA por companhias estrangeiras aprovou o pedido da DP World para assumir a operação de carga e descarga nos portos americanos. Eles vão de um suave projeto de lei do senador Charles Shummer, democrata de Nova York, que se limitou a pedir à administração um novo exame da petição da DP World e o compartilhamento das informações com o Congresso, a uma proposta co-patrocinada pelo deputado republicano Jim Saxton, de Nova Jersey, que reserva exclusivamente a companhias americanas as atividades de construção e operação da "infra-estrutura crítica" do país. Dos cerca de cem portos marítimos internacionais dos EUA, apenas oito são totalmente operados por companhias americanas.

Embora tenham enormes implicações econômicas e sinalizem uma nova atitude nacionalista dos EUA em relação aos investimentos externos, os projetos são uma reação puramente política. No lado dos democratas, que foram acusados pela Casa Branca de serem frouxos na defesa do país contra o terrorismo, a ofensiva contra a DP World é alimentada pelo desejo de usar contra Bush o medo genuíno, que ironicamente ele próprio ajudou a criar na população, de que entrada de uma empresa árabe na operação de portos americanos tornaria os EUA mais vulneráveis a um novo ataque terrorista de grande dimensão.

Do lado dos republicanos, trata-se de não deixar o campo livre para os democratas faturarem politicamente o assunto num ano eleitoral em que está em jogo o controle da Câmara. Bush já anunciou que vetará qualquer legislação que tente impedir a entrada da estatal árabe no mercado americano, por duas razões principais. Dubai e os Emirados Árabes são grandes aliados dos EUA no mundo árabe e o bloqueio do negócio minaria a posição dos regimes moderados do Oriente Médio politicamente próximos de Washington. Por outro lado, uma ação protecionista do Congresso teria um efeito econômico danoso para um país que depende de investimentos estrangeiros para cobrir o imenso déficit de suas contas externas

LEI PATRIÓTICA

Bush sancionou a prorrogação, aprovada pelo Congresso, da Lei Patriótica, que oferece instrumentos legais à Casa Branca para combater o terrorismo. O novo texto aprovado pelos parlamentares renova 16 dispositivos previstos na redação original que são criticados pela oposição democrata e organizações de direitos humanos. Entre eles figura um que permite a funcionários americanos confiscar "objetos tangíveis", como documentos de bibliotecas e livrarias que estiverem relacionados às investigações antiterroristas.