Título: EUA não intervirão em guerra civil
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2006, Internacional, p. A15

Segundo Rumsfeld, tarefa de conter a luta sectária será entregue às forças de segurança iraquianas

Se a guerra civil latente há semanas entre xiitas, sunitas e curdos degenerar num conflito aberto e generalizado, os Estados Unidos não se envolverão e entregarão a tarefa de conter a violência às forças iraquianas supostamente leais ao frágil governo de Bagdá.

Sob pressão dos membros de uma comissão do Senado para justificar a aprovação de dotação suplementar de US$ 91 bilhões, que inclui verbas para as guerras do Iraque e do Afeganistão, o secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, disse ontem que "o plano é evitar uma guerra civil". Mas ele acrescentou que "na medida em que uma (guerra civil) ocorrer", o plano, "do ponto de vista de segurança, é que as as forças de segurança (iraquianas) lidem com isso até onde forem capazes".

Foi a primeira vez que o chefe do Pentágono deixou implícita a hipótese de uma retirada acelerada das forças americanas no Iraque, na hipótese de o país mergulhar de vez numa guerra de facções em lugar de avançar no rumo da estabilização política, preferido por Washington.

Em entrevista ao Los Angeles Times, o embaixador dos EUA em Bagdá, Zalmay Khalilzad, afirmou esta semana que não rejeita o cenário da guerra civil, que poderia propagar a violência sectária por toda a região "e fazer o Taleban no Afeganistão parecer brincadeira de criança".

Na terça-feira, Rumsfeld havia negado que o Iraque vive uma guerra civil e desmentira relatos publicados na imprensa britânica de que o grosso dos mais de 130 mil soldados americanos no Iraque voltarão para casa o mais tardar em 2007.

Rumsfeld, a secretária de Estado, Condoleezza Rice, e o chefe das forças americanas no Oriente Médio, o general John Abizaid, esforçaram-se para convencer os senadores de que os planos do governo Bush no Iraque continuam nos trilhos a despeito da explosão de violência que deixou centenas de mortos desde o dia 22, quando rebeldes sunitas destruíram um templo sagrado xiita em Samara. Mas Abizaid admitiu que a situação no Iraque está mudando de natureza, "de uma rebelião para a violência sectária". O general disse que a situação ainda está sob controle, mas talvez não por muito tempo.

"É minha impressão que precisamos nos mover rapidamente na direção de um governo de unidade nacional." Segundo ele, "não há nenhuma dúvida de que as tensões sectárias são maiores (hoje) do que vimos (no passado) e isso é uma grande preocupação para nós".

Em entrevista à TV CNN, o ex-embaixador do Iraque na ONU durante o regime de Saddam Hussein, Mohamed al-Duri, declarou que seu país caminha para a guerra civil e culpou as forças americanas pelo alastramento da violência sectária. "Creio que a ocupação intensificou os problemas sectários", disse Al-Duri, que vive nos Emirados Árabes Unidos. Para ele, as forças americanas agem como um ímã para os extremistas.