Título: Líder do MST aprova ação no Sul e ataca pesquisadora
Autor: Angela Lacerda
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2006, Nacional, p. A12,13

Determinado e radical, estilo de Jaime Amorim inspira movimento

O líder do Movimento dos Sem-Terra (MST) Jaime Amorim aprovou ontem a depredação na Aracruz Celulose, no Rio Grande do Sul, ocorrida anteontem. "Não estamos preocupados com a nossa imagem", disse ele, ao ser questionado sobre a violência empregada na ação. Tampouco se sensibilizou com o choro da pesquisadora que viu anos de trabalho serem destruídos. "Se fosse uma pesquisadora séria, não teria se vendido às multinacionais", afirmou. "Ela representa um tipo de venda de soberania."

O mais conhecido líder do movimento, João Pedro Stédile, fez coro ao grito de guerra declarado por Amorim: "As companheiras mulheres (que invadiram a Aracruz ) estão de parabéns pelo ato de chamar a atenção da sociedade."

Aos 46 anos, Amorim é a maior liderança do MST em Pernambuco. Responsável pela organização no Estado, não usa meias palavras para expressar suas posições - radicais até para o MST. Ele é natural de Santa Catarina, ingressou no movimento social e de luta pela terra através da Igreja. Casado com Rubineusa Souza, liderança ativa do MST na área da educação, com quem tem três filhos, mora em Caruaru, no agreste, quartel-general do movimento. Está lá desde 1987.

Mesmo com o crescimento do movimento no Estado e a formação de líderes estaduais, Amorim, que integra a direção nacional, é sua maior referência. Está presente em todas as grandes manifestações, assim como no planejamento.

Após quase duas décadas em Pernambuco, acumulou processos judiciais por vários motivos: incêndio de tratores e ocupação de terra, bloqueio de estradas, invasão de navio vindo da Argentina com milho transgênico, ocupação da sede do Incra com reféns, retirada de produtos geneticamente modificados em supermercados.

Há cerca de um mês, teve a prisão decretada por depredação de veículos em uma rodovia, mas a ordem foi revogada.

INFLUÊNCIA

Ontem, ao comentar a depredação no Sul, Amorim explicitou objetivos que vão além da reforma agrária. Para ele, o importante é que o ato da Via Campesina e do MST ajude a sociedade a discutir o sistema produtivo e os produtos geneticamente modificados. "O País não pode ficar refém das florestas homogêneas, como a de eucalipto, nem de monoculturas, que destroem o meio ambiente."

A tática de Amorim influenciou outros movimentos de luta pela terra, mais comedidos desde as Ligas Camponesas, de Francisco Julião, que reuniam canavieiros na Zona da Mata e foram duramente reprimidas pelos governos militares.

Amorim pega na foice para derrubar cercas e está sempre junto dos acampados e assentados, o que reforça a sua liderança. Tem a confiança dos sem-terra, que vêem nele e no movimento alguém que se preocupa com sua realidade e necessidades. Amorim recorreu à greve de fome com outros companheiros, há dez anos, para forçar a desapropriação da Fazenda Normandia, em Caruaru. Se for preciso, ele garante que voltará a fazer jejum.

Ações consideradas radicais e extremistas se transformam em mecanismo de luta, nas suas explicações. Para ele, ocupação do Incra com queima de veículos "visou unicamente a fortalecer a infra-estrutura do órgão". Depredar laboratório da Aracruz "tem o objetivo de defender a saúde do povo e a soberania nacional".

Nesse contexto, o caminho que começa a ser trilhado pelo MST, de combate às multinacionais, por devastar a agricultura e o meio ambiente, "ameaçando a soberania nacional", é perfeitamente defensável.

AVESTRUZES

Ontem, a ala do MST conduzida por Amorim promoveu nova ação. Cerca de 200 pessoas derrubaram um outdoor da Avestruz Master, na frente da fazenda onde são criadas 502 aves, em Vitória de Santo Antão, zona da mata pernambucana.

O grupo ocupou a propriedade por uma hora e meia, para um "protesto simbólico" contra "a mentira do agronegócio e a financeirização da agricultura" - termos do próprio Amorim.

Ele pediu a punição donos da Avestruz Master, que culpou por prejuízo causado a centenas de pessoas que investiram no negócio e pelo sofrimento dos animais - muitos morreram de fome e sede. "É um modelo que não precisa trabalhar na terra, basta criar um projeto e iludir as pessoas."