Título: Lula decide manter tropas no Rio
Autor: Roberta Pennafort, Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/03/2006, Metrópole, p. C1

Comando e Planalto negam que desocupação de favelas seja recuo; soldados fazem ações pontuais em 2 locais

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu ontem manter as tropas do Exército na busca às armas roubadas no dia 3 de um quartel no Rio. A decisão foi tomada durante a reunião semanal de coordenação política do governo, na qual estavam presentes o vice-presidente e ministro da Defesa, José Alencar, e seis ministros. No encontro, que começou de manhã e foi interrompido para que Lula recebesse o presidente da Guatemala, Oscar Berger, o presidente endossou as ações do Exército e foi informado de que elas, agora, serão pontuais e não em grande escala, como vinha ocorrendo até domingo.

A nova estratégia, sempre seguindo orientação da inteligência do Exército - que atua em conjunto com Marinha, Aeronáutica e a Secretaria de Segurança do Rio - implicará menor visibilidade das tropas. "Não há recuo do Exército", garantiu o Palácio do Planalto, ao comentar o relato feito por Alencar a Lula sobre a operação, criticada por moradores e juristas. "Tudo o que está sendo feito (pelo Exército) foi aprovado pelo presidente", afirmou o Planalto.

Nas conversas com os ministros, Lula disse considerar a ação positiva. Na semana passada, na Inglaterra, ele tinha dito que "o Exército tem de procurar aquilo que é seu".

Pouco antes da reunião em Brasília, o chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Leste (CML), general Hélio Macedo, fez declaração semelhante no Rio. Disse que não houve recuo nem erro nem fracasso da ocupação. E garantiu que as tropas poderão voltar, caso surjam novas denúncias sobre as armas. Ontem, já ocorreram operações do Morro do Dendê e na Vila dos Pinheiros, zona norte, mas nada foi apreendido.

Não há previsão para a desmobilização das tropas - tanto que os 800 soldados levados de Minas para Petrópolis continuam de prontidão. Mas os militares não passarão mais as noites nas favelas. "Os mandados só podem ser cumpridos até as 18 horas", justificou o general.

Macedo deu entrevista a jornalistas do Brasil e do exterior no lugar do comandante militar do Leste, general Domingos Curado, que estava em Brasília. Afirmou que o resultado da operação até aqui é "muito bom", uma vez que, apesar de as armas roubadas não terem sido encontradas, os índices de criminalidade caíram (Macedo não citou números).

As operações no Dendê e na Vila dos Pinheiros, parte do Complexo da Maré, foram realizadas para cumprir quatro mandados de busca. Para chegar às favelas, as tropas passaram pela Linha Vermelha. Na Vila dos Pinheiros, um angolano foi preso e liberado em seguida pela Polícia Militar.

O CML já admite que a dificuldade de recuperar as armas poderá ser maior do que se pensava, pela possibilidade de elas estarem fora do Estado. Mas Macedo fez questão de frisar: "Não houve retrocesso. Continuamos buscando com otimismo e motivação."

O general não quis comentar se a permanência dos soldados em favelas durante dez dias manchou a imagem do Exército - os militares foram surpreendidos com reações violentas de traficantes e hostilizados por moradores. Admitiu, porém, que a invasão do quartel do Estabelecimento Central de Transporte (ECT) trouxe desgaste à Força - detalhes do Inquérito Policial-Militar aberto sobre o caso não foram divulgados. "Isso não é bom para nenhuma instituição. Foi um roubo dentro de uma unidade, não foi durante o transporte."

O secretário de Segurança, Marcelo Itagiba, disse que durante a operação, iniciada no dia 3, a polícia pôde se ocupar de outras favelas e, nelas, recuperou 228 armas e fez 38 apreensões de drogas. "Não queremos intervenção, e sim integração."