Título: Duas semanas depois da denúncia do caseiro, Palocci pede demissão
Autor: João Domingos e Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/03/2006, Nacional, p. A4

O escândalo da violação da conta bancária do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo, derrubou ontem o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e o presidente da Caixa Econômica Federal (CEF), Jorge Mattoso. Palocci caiu duas semanas depois de ser desmentido pelo caseiro, que em entrevista publicada pelo Estado no dia 14 afirmou que o ministro era assíduo freqüentador da mansão alugada no Lago Sul, em Brasília, por ex-assessores seus na prefeitura de Ribeirão Preto.

O substituto de Palocci será o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Guido Mantega, que garantiu: a política econômica não muda. "Essa política econômica foi a de maior êxito dos últimos 15 anos", afirmou. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Murilo Portugal, foi outro que pediu exoneração. Para o lugar de Mantega na presidência do BNDES vai Demian Fiocca, vice-presidente da instituição. Na vaga de Mattoso, entra Maria Fernanda Ramos Coelho, funcionária da Caixa há 23 anos.

Palocci dissera em depoimento à CPI dos Bingos que jamais tinha estado na mansão do Lago Sul. Além de ser desmentido por Nildo sobre suas relações com a chamada república de Ribeirão, o ministro se viu enredado numa série de irregularidades para desqualificar o caseiro como testemunha. Dois dias depois de sua entrevista ao Estado, Nildo teve seu sigilo bancário violado na Caixa Econômica Federal. O escândalo chegou a seu ápice ontem, com o depoimento do presidente da Caixa à Polícia Federal.

PESSOALMENTE

Mattoso revelou à PF que entregou pessoalmente os extratos bancários de Nildo a Palocci, na casa funcional que fica na Península dos Ministros, também no Lago Sul, a cerca de 4 quilômetros de distância da mansão alugada pelos amigos da república de Ribeirão Preto. Segundo o caseiro, nesse imóvel alugado por R$ 10 mil mensais, dinheiro vindo de Ribeirão Preto em caixas era repartido entre os ex-assessores de Palocci.

O ministro deixou o governo desmoralizado diante do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Os direitos da cidadania estão acima das circunstâncias e dos indivíduos. Na medida em que o Estado de Direito não foi respeitado nesse episódio (a violação do sigilo de Nildo), o presidente imediatamente muda sua equipe com o afastamento do presidente da Caixa Econômica Federal e do ministro da Fazenda e faz a nomeação do novo ministro", disse o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), ao deixar uma reunião com Lula, da qual também participou Mantega, o sucessor de Palocci.

"Os que estavam envolvidos tiveram também a grandeza de reconhecer a gravidade do erro e pediram o afastamento do governo", afirmou Mercadante. "O ministro, ao encaminhar seu pedido de demissão, demonstra espírito público e reconhecimento pelo erro que foi cometido. Na democracia, as circunstâncias e os indivíduos não vão pesar nas decisões deste governo. O cidadão terá seus direitos preservados. Ninguém está acima da lei e dos direitos da cidadania."

Para Mercadante, a troca de comando na economia não trará complicações. "O País vive um quadro de estabilidade econômica e é muito importante que isso seja preservado", afirmou. "O ministro Guido Mantega, que acompanha todo esse trabalho, sabe das orientações do presidente. Esse rumo de segurança e estabilidade será mantido."

Palocci encaminhou seu pedido de demissão - que chamou de "afastamento" - por volta das 17 horas. Mandou também ao presidente uma carta com suas justificativas. Lula aceitou o "afastamento", mas assessores no Planalto foram orientados a dizer aos líderes petistas e de partidos aliados que se tratava de demissão. Como tal, poderiam fazer a comunicação ao Congresso.