Título: Na véspera da decisão, Serra diz que aceita candidatura, mas sem prévias
Autor: Carlos Marchi, Ana Paula Scinocca
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/03/2006, Nacional, p. A10

Prefeito cogita concorrer ao Planalto desde que não haja disputa interna e cria dificuldades para anúncio de Alckmin

A poucas horas do prazo final para a escolha do candidato do PSDB à Presidência, o prefeito José Serra afirmou em público pela primeira vez que está disposto a deixar a Prefeitura paulistana para ser candidato, desde que o partido não faça prévias. O governador Aécio Neves convidou outros governadores para estarem hoje em São Paulo, o que aumenta a pressão sobre Serra, já que todos apóiam o governador Geraldo Alckmin e devem se reunir com ele ainda durante a manhã.

A fala de Serra se destinava a ganhar mais tempo e empurrar a decisão mais para a frente, segundo serristas, e parece ter conseguido, no mínimo, embolar o jogo. Mas pelo menos um integrante do triunvirato que coordena a escolha do candidato interpretou que, com a fala, Serra começou a "jogar a toalha", porque ele sabe que o triunvirato já estabeleceu as regras do jogo e, não havendo acordo, o Diretório Nacional do PSDB será chamado para, pela primeira vez na história do partido, escolher um candidato pelo voto.

Um jantar do triunvirato tucano - o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o senador Tasso Jereissati e o governador Aécio Neves - com Serra entrou pela madrugada, no Hotel Blue Tree Towers. Embora Tasso tenha garantido que o nome do candidato seria anunciado hoje, não havia nada preparado para o anúncio - prenunciado como uma festa - até o fechamento desta edição. Alckmin cancelou uma ida ao Rio e suspendeu toda a agenda de hoje.

AS CULPAS

No PSDB, a incerteza sobre o anúncio do candidato fez com que muitos começassem a falar mal de muitos. Há críticas à direção partidária por não ter fixado critérios para a escolha no início do processo. Membros do triunvirato confidenciaram a amigos que, nas consultas dos últimos dias, ouviram muitas queixas de Serra, que atravessou os últimos três meses indeciso sobre sua candidatura. Para eles, Serra perdeu o timing da decisão. Ontem, quase ungido, Alckmin disse apenas que "as informações estão disponíveis para que o PSDB tome uma boa decisão".

Mais cedo, Serra ensaiou, depois de três meses calado, a explicação de sua pré-candidatura: "Ao longo desses meses, tenho evitado falar sobre candidatura, mas tenho aparecido na liderança das pesquisas, um reconhecimento da população brasileira", disse ele às TVs Record e Cultura no meio da tarde.

A fala irritou o triunvirato, relataram fontes tucanas, porque Serra estava devidamente informado de que a única forma de confirmar a sua indicação seria através de prévias, já que Alckmin não abre mão de sua candidatura. A sua insistência em ser aclamado, descartando Alckmin, acabou atraindo mais simpatias para o governador.

Ontem os serristas coalharam São Paulo com a versão de que a nova rodada da pesquisa CNI/Ibope daria Serra "muito à frente de Lula". Mas a versão não era verdadeira: os questionários da nova rodada da CNI/Ibope começaram a ser tabulados apenas na tarde de ontem, o que ainda não permitia antecipar resultados. Os resultados da pesquisa só serão anunciados no dia 16, quinta-feira.

Ao sair de casa, à tarde, Serra afirmou que decidiu atender a um apelo dos "colegas de partido" que, segundo ele, estavam desejosos de apoiar a sua candidatura. "Decidi deixar à disposição do partido a minha indicação para disputar a Presidência da República, mas sem realização de prévias", afirmou.

Alckmistas e serristas presumiam ontem que Serra, aparentemente, tem maioria entre os 213 membros do Diretório Nacional. No entanto, foi ele quem acabou recusando a consulta, que certamente causaria uma fratura sem precedentes e provavelmente condenaria o partido a, mais uma vez, enfrentar uma campanha presidencial dividido ao meio.

"Prévias trazem o risco de divisão do partido, favorecendo os adversários. Para ganhar uma eleição dessa importância, é preciso unidade, união, esforço e humildade", disse Serra. Alckmin não mostrou temores: "Tenho a certeza de que o PSDB vai chegar à eleição forte e unido."