Título: Saída de Palocci acaba com o núcleo duro do Planalto
Autor: João Domingos e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/03/2006, Nacional, p. A10

A queda de Antonio Palocci pôs fim ao que restava do chamado núcleo duro do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Forjado no começo de 2003 pelo time que articulou a vitória de Lula nas eleições presidenciais, o trio formado por Palocci e pelos ex-ministros José Dirceu e Luiz Gushiken se tornou o dínamo do governo petista. Com o aval do presidente, o núcleo era responsável pela articulação política e pela condução dos principais programas do governo.

Três anos depois, a situação do trio mudou radicalmente: passou de força motora da administração petista a fator de risco para a permanência de Lula no Planalto e para o seu projeto de reeleição. Durante esse espaço de tempo, todos foram alvejados por suspeitas e acusações de corrupção e se transformaram num fardo político para o governo do PT.

O primeiro sinal de que o tal núcleo duro não iria longe veio com o caso Waldomiro Diniz, em fevereiro de 2004, após a divulgação de uma fita de vídeo feita em 2002 - na qual o principal assessor do então chefe da Casa Civil, José Dirceu, cobrava propina de um empresário da área de loterias.

O escândalo fez o governo sangrar por dois meses. Principalmente devido às suspeitas de que Waldomiro teria participado da cobrança de propina para que a Caixa Econômica Federal renovasse o contrato de operação de loterias com a multinacional Gtech. Mesmo pressionado, Lula manteve Dirceu no cargo, enquanto a tropa de choque do governo no Congresso abafava a criação de uma CPI.

O preço por essas decisões foi cobrado um ano depois, com as acusações do ex-deputado Roberto Jefferson de que o chefe da Casa Civil teria montado um gigantesco esquema de corrupção, com o pagamento de mesadas a parlamentares para garantir ao governo o apoio da base aliada no Congresso - o chamado mensalão. Dessa vez, o Planalto não conseguiu conter a onda de denúncias e teve que assistir à criação de três CPIs simultâneas para apurar as acusações.

OSTRACISMO

Em poucas semanas, o escândalo provocou a queda de José Dirceu e do então ministro da Comunicação Institucional, Luís Gushiken. Conselheiro de Lula desde o começo do PT, Gushiken comandava a publicidade do governo e não resistiu às acusações de irregularidades. Não chegou a sair do governo, mas foi rebaixado a um cargo sem relevância -operacional ou política - e hoje amarga o ostracismo.

Quando deixou o governo para a fracassada tentativa de salvar seu mandato no Congresso, Dirceu avisou: "O próximo alvo é Palocci". Na época, o então ministro da Fazenda confidenciou a amigos que temia "se tornar um novo Dirceu".

A profecia do ex-homem forte do governo e desafeto do ministro da Fazenda se concretizou. Palocci foi cercado por acusações de corrupção da época em que foi prefeito de Ribeirão Preto.

Apesar das denúncias, Lula adotou a mesma estratégia que não tinha funcionado com Dirceu: resolveu bancar o ministro. Foram seis meses de desgaste, até a queda do último remanescente do grupo que dava as cartas na gestão do PT.