Título: 'Parece que Condoleezza sonha comigo', diz Chávez
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Fonte: O Estado de São Paulo, 18/02/2006, Internacional, p. A24

Presidente responde à acusação da secretária de Estado americana de que Venezuela ameaça a democracia dizendo que líderes dos EUA estão loucos

Em resposta à secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, que qualificou a Venezuela de "ameaça para a democracia da região", o presidente venezuelano, Hugo Chávez, disse que os líderes dos EUA "estão loucos". "Ela (Condoleezza) disse algo muito grave e fez o mundo saber que está telefonando a chanceleres pra fazer alertas sobre a Venezuela", declarou Chávez. "Os funcionários americanos estão loucos e estamos preparados para resistir ao atropelo imperialista e aos esforços do governo dos EUA para isolar a Venezuela", prosseguiu.

Condoleezza alertou para o risco que a Venezuela significa para a região durante uma audiência ante a Comissão de Relações Exteriores da Câmara. Ela acrescentou ter conversado por telefone com os chanceleres do Brasil, Espanha e Áustria "para que haja uma espécie de frente unida contra algumas coisas nas quais a Venezuela está envolvida".

"Parece que ela sonha comigo", continuou Chávez, referindo-se à secretária de Estado, a quem qualificou de "dama imperial". "Sou capaz de convidá-la para uma reunião para perguntar a ela: 'O que acontece com você em relação a mim?'"

Durante a audiência de quinta-feira, Condoleezza mencionou a "particularmente perigosa aproximação da Venezuela com Cuba" e as restrições às atividades da organização cívica Súmate - que o governo venezuelano acusa de traidora por receber fundos dos EUA.

A vice-ministra de Relações Exteriores da Venezuela, Mary Pili Hernández, disse ontem que seu governo pedirá esclarecimentos sobre uma declaração de Condoleezza, segundo a qual os EUA pediriam "apoio internacional" para uma greve geral de trabalhadores de transporte venezuelanos. Sustentou que para o governo da Venezuela essa intervenção constitui uma "clara ingerência" em assuntos internos do país.

As declarações de Condoleezza foram feitas dois dias depois de uma reunião entre o Secretário-Adjunto de Estado para a América Latina, Thomas Shannon, e o embaixador venezuelano em Washington, Bernardo Álvarez - com o objetivo de aliviar a tensão nas relações entre os dois países nas últimas semanas. "Há dois dias chegou um relatório de nosso embaixador que, eu juro, recebi com otimismo. E agora sai Condoleezza dizendo o que disse", queixou-se Chávez. "Estão loucos. Não chegam a um acordo. Daí se deduz que o governo de (George W.) Bush não tem política de relações exteriores. Nos EUA, não manda o sr. Bush, mas sim outros fatores."

Mais tarde, o presidente venezuelano anunciou que está tomando medidas para um eventual corte das exportações de petróleo aos EUA caso Washington "continue tentando desestabilizar a Venezuela". O país é o quarto maior fornecedor de petróleo para os EUA. Por seu lado, produtos americanos constituem mais de 30% das importações venezuelanas.

Há duas semanas, o governo venezuelano expulsou o adido naval americano em Caracas, acusando-o de espionagem. O regime de Chávez também ordenou a expulsão do país do grupo missionário dos EUA Nuevas Tribus, que tentava converter ao cristianismo indígenas de aldeias isoladas. Ao mesmo tempo, o secretário de Defesa americano, Donald Rumsfeld, comparava Chávez a Hitler, ao afirmar que o ditador nazista também tinha chegado ao poder por meio de uma votação legítima.

Em Brasília, um funcionário do Ministério de Relações Exteriores disse que os laços entre Brasil e Venezuela são "excelentes".