Título: 'O importante é a política do Estado', diz Pascal Lamy
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/03/2006, Economia & Negócios, p. B4

O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, que embarca para o Rio de Janeiro na quinta-feira, disse ontem, em Genebra, acreditar que o novo ministro da Fazenda, Guido Mantega, dará continuidade à política econômica do ex-ministro Antonio Palocci. "O importante é a política do Estado. Se entendi bem o sentido dessa mudança e as declarações do novo ministro, não tenho razão para pensar que haverá mudanças na política agressiva e ativa do Brasil, assumindo as suas responsabilidades", afirmou Lamy.

A queda de Palocci chegou a ser tema de comentários nos corredores da sede da OMC. No gabinete de Lamy, assessores se mostravam informados sobre o escândalo que derrubou o ministro e já tinham as primeiras avaliações sobre Guido Mantega. "Ouvimos dizer que ele manterá a política de Palocci", disse um assessor.

As "responsabilidades" citadas por Lamy podem ser entendida, segundo diplomatas, como a necessidade de o Brasil também flexibilizar a sua posição para permitir um acordo na Rodada Doha. O Ministério da Fazenda era, no governo brasileiro, o que mais apoiava a liberação das tarifas de importação de bens industriais, um dos temas mais debatidos na OMC.

Num documento que vazou para a imprensa no ano passado, o Ministério da Fazenda se mostrava disposto a fazer cortes de até 75% nas tarifas de importação de bens industriais. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e o Ministério do Desenvolvimento reagiram contra a proposta.

Eleições e Doha Lamy começou a demonstrar preocupação com as eleições em vários países no segundo semestre, incluindo o Brasil. Por isso, segundo ele, será preciso acelerar as negociações da Rodada Doha para a abertura do comércio mundial.

O diretor-geral da OMC participa no Rio de Janeiro da reunião entre Brasil, Estados Unidos e União Européia (UE), agendada para tentar avançar nas negociações de Doha. Ainda assim, ele continua a rejeitar a idéia do governo brasileiro de realizar uma cúpula de chefes de Estado para destravar a negociação.

Ontem, a delegação brasileira voltou a insistir na reunião da OMC que o setor de produtos industriais "não é o problema" nas negociações. "Os países em desenvolvimento já se comprometeram a fazer mais que na Rodada Uruguai. Se não concluirmos a rodada até o fim do ano, não será por causa dos produtos industriais", disse um negociador brasileiro.

Mas, segundo Lamy, o Brasil terá de flexibilizar sua posição em relação às tarifas para bens manufaturados, exigência da Europa e dos Estados Unidos para que dêem em contrapartida mais acesso aos produtos agrícolas brasileiros. Por enquanto, o Brasil aceita um corte de 50% em suas tarifas, mas já insinuou que poderia acatar até mesmo 65%.